domingo, 21 de junho de 2015

Senhor, anota meu nome e minha matrícula? O lugar esquecido pelos juízes


O drama da maioria é parecido. Eles viram carne podre na máquina emperrada do judiciário paulista, ineficiente, um castelo de cartas carcomidas, formada por juízes que parecem muito eficazes em superlotar o sistema, mas que não concedem os direitos de progressão e de cumprimento de pena garantidos pelo processo de execução penal. “Apodreçam!” É a sentença.

Bruno Paes Manso
Dia de jogo do Brasil e Panamá. Véspera de Copa do Mundo. São 13 horas no CDP III de Pinheiros, onde quatro raios superlotados comportam 1.850 homens. O prédio foi feito, na verdade, para 572 pessoas. É hora do banho de sol e todos estão do lado de fora. Em cada um dos pátios, retângulos menores que uma quadra de salão, os presos jogam futebol num ambiente de Maracanã lotado. Cinco jogadores para cada lado. Os demais 1.810 presos apenas observam. O público é maior do que muitos jogos da maioria dos campeonatos regionais do Brasil.
Eu e mais três colegas, André, Nikolaos e Rafael, pesquisadores do Núcleo de Estudos da Violência da USP, entramos em duas das quadras, acompanhando do padre Valdir João da Silveira, padre Eugênio e Marcelo Naves, da Pastoral Carcerária, para conhecer mais de perto a realidade do sistema penitenciário paulista. Há um misto de tensão e curiosidade na entrada. Qual o efeito que a presença de quatro extraterrestres, chegando do nada, apresentados como estudantes da USP, pode ter naquela massa abandonada?
Descobrimos logo ao entrar. Eu carrego um bloquinho de anotação e uma caneta bic. É o suficiente para seja visto como uma boia jogada ao mar no meio de um naufrágio. Eles vão nos rodeando aos poucos. Bastava demonstrar algum interesse pelas histórias para que começassem uma fila de lamentações. Trajetórias trágicas que quase sempre se repetem, apesar de serem acusados por tipos de crime diferentes.
(...)



Bruno Paes Manso – Formado em economia (USP) e jornalismo (PUC-SP), trabalhou por dez anos como repórter no jornal O Estado de S. Paulo. Também atuou na Revista Veja, Folha da Tarde e Folha de S. Paulo. Atualmente faz pós-doutorado no Núcleo de Estudos da Violência da USP. Concluiu o mestrado e doutorado no departamento de ciências políticas da Universidade de São Paulo, onde pesquisou o crescimento e a queda dos homicídios em São Paulo. É autor do livro O Homem X - Uma reportagem sobre a alma do assassino em SP, que ganhou o Premio Vladimir Herzog de melhor livro reportagem de 2006 – 04.06.2014
IN São Paulo no Divã – blog Estadão.