Especialistas apontam
propostas para um Judiciário mais transparente, sem privilégios, com maior
democracia interna e aberto à participação social.
Vinicius Mansur
Devido à histórica “assepsia social” da Justiça brasileira, uma série de
organizações tem voltado seus esforços para mudar essa realidade. Entre elas
está a Articulação Justiça e Direitos Humanos (JUSDH).
“No âmbito da decisão jurisdicional, trabalhamos para que a Justiça
tenha maior sensibilidade em relação aos problemas econômicos, sociais e
culturais da sociedade brasileira, que seja um Judiciário voltado para a
solução dos problemas e para efetivação dos direitos humanos, não apenas
voltada para o fim do processo judicial. Muitas vezes uma decisão judicial dá
início a um conflito social”, relata o representante da JUSDH Antônio Sérgio
Escrivão Filho.
No âmbito da estrutura do Judiciário, a articulação apresenta uma pauta
robusta de reivindicações. Uma delas é a reedição da Lei Orgânica da
Magistratura Nacional (Loman), uma herança da ditadura militar que o STF está
encarregado de reformular desde 2004, por determinação da Emenda Constitucional
45.
Participação social
Através da nova Loman pode-se acabar com as férias de 60 dias e a
aposentadoria compulsória como pena máxima dos magistrados, além de prever
mecanismos de participação social na política de Justiça, na sua administração
e novas formas de eleição das cúpulas do Judiciário.
“Assim pode-se abrir canais de diálogo e efetiva participação social na
elaboração da sua política de Justiça, como a experiência de orçamento
participativo no Tribunal do Espírito Santo. Pode-se também mudar a forma de
ingresso na magistratura. Os concursos públicos hoje são voltados para decorar
os códigos, as leis, mantendo uma distância enorme das noções de direitos
humanos e da realidade brasileira. Outra mudança poderia vir na forma de
escolha de ministros dos órgãos superiores da Justiça, hoje realizadas sem
qualquer participação ou transparência”, aponta o representante da JUSDH.
O presidente da AJD José Henrique Rodrigues Torres reforça a necessidade
de mudança na forma de eleição das cúpulas dos tribunais. Atualmente, o
presidente, o vice-presidente e o corregedor de um tribunal são desembargadores
escolhidos somente entre os próprios colegas, sendo candidatos os três mais
velhos. “O pleito tinha que ser aberto democraticamente para que todos
mostrassem suas propostas. Hoje, quando eles assumem nós não sabemos qual é. E
por que não pensar na participação dos funcionários da Justiça? Eu já ouvi a
seguinte crítica: os desembargadores vão ter que se vincular à base eleitoral.
E qual é o problema? Atualmente ele se vincula a quê?”, indaga.
Nomeação para o STF
Torres também sugere a mudança na escolha dos ministros do STF , hoje um
cargo vitalício indicado pela Presidência da República e, historicamente,
homologado após uma sabatina no Senado. “Todo ministro do STF foi nomeado em
razão de forças políticas. Não há nada de errado nisso, o que me causa espécie
é fazê-lo por debaixo dos panos. Ninguém sabe quais são as forças que indicam,
que critérios são usados. Por que não se estabelece a participação da sociedade
nessa escolha? Na Argentina há a possibilidade de consulta popular. Então,
quando o presidente escolhe João ou Maria para assumir o cargo, sabe-se quais
forças políticas o levaram até lá”. Outra ideia levantada por Torres é o
estabelecimento de um mandato para esses ministros, ao invés da nomeação
perpétua.
Já o jurista Carlos Marés defende o controle externo do Judiciário, não
apenas limitado ao seu orçamento e atos administrativos, mas com poder de
incidir nas decisões judiciais que importem em questões sociais. “Essas têm que
ser democraticamente controladas porque são políticas públicas”, argumenta. Ele
também defende que o poder Judiciário não seja formado só por bacharéis de
Direito. “O curso de Direito serve para decidir tecnicamente o que diz a lei.
Se vamos discutir a produção da energia elétrica em Belo Monte e a natureza dos
povos indígenas, não estamos numa discussão jurídica. Um engenheiro, um
biólogo, um economista, um antropólogo discutem isso melhor”, defende.
Vinícius Mansur – 13.12.2012