terça-feira, 20 de outubro de 2015

Civilização em estresse permanente


Dos primórdios da psicanálise, um cenário inimaginável atualmente é a configuração da prática clínica. Nos tempos de Freud, o analisado fazia sessões seis vezes por semana. Nos dias atuais, ter à disposição 50 minutos durante uma vez por semana para simplesmente falar sobre o que lhe vier à cabeça (mas sendo ouvido), longe da agitação do lado de fora do consultório, pode chocar os “empresários de si mesmos”. Na cultura do ato, a reflexão é uma subversão.


Bruno Yutaka Saito
Dick Cavett, o entrevistador, pergunta para Woody Allen: “Como você sabe se a psicanálise te ajudou? Quando você decide que terminou?” Era 1971 e o cineasta americano ainda não tinha feito clássicos como “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa” nem se tornado uma espécie de garoto-propaganda informal da teoria/prática terapêutica criada por Sigmund Freud (1856-1939). “Não sei se você realmente termina. Sei que certas características minhas estão diferentes de quando eu comecei. Eu tinha 22 anos e agora tenho 35. Então tenho idade – e isso é algo”, responde Allen no talk-show, em seu habitual tom zombeteiro que busca disfarçar, mas nem tanto, temas graves.
Neste começo de século XXI, em que homens, profissões, produtos e formas de pensamento enfrentam o risco constante de se tornar obsoletos, a psicanálise, uma das grandes criações do século XX, pode parecer uma prática excêntrica ou anacrônica, como ouvir discos de vinil e usar máquina de escrever. Freud vai se juntando a nomes como Karl Marx (1818-1883) na galeria dos pensadores que são demonizados em ondas revisionistas. Entre os defensores está a francesa Élisabeth Roudinesco, autora de uma nova biografia de Freud.
Enquanto rapidez, performance e resultados mensuráveis são buscados constantemente no cenário contemporâneo, a psicanálise caminha em um ritmo particular. Seus detratores costumam recitar três críticas: ela não tem eficácia comprovada, seria um método caro e tem duração longa. Nos EUA, foi moda entre os anos 40 e 60 ao ser confundida com uma terapia da felicidade e teve entusiastas como Alfred Hitchcock (1899-1980) e Leonard Nimoy (1931-2015).
Hoje, naquele país, pouco se questiona se a psicanálise é ciência ou filosofia, posição intermediária que lhe confere lugar peculiar na produção de conhecimento do Ocidente. Enquanto a psicologia vai se tornando mais científica, a psiquiatria, mais biológica, e a neurociência faz o mapeamento do cérebro, a psicanálise vem sendo estudada nos departamentos de letras das faculdades americanas. Nessa interpretação, ela é um modo de entender a construção da história pessoal do indivíduo. No Brasil, mantém proximidade com departamentos de psicologia.
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Bruno Yutacca Saito – 28.08.2015.

IN Valor Econômico, ed. Impressa, caderno Eu & fim de semana.




Um Freud entre Fausto e Mefisto

Elisabeth Roudinesco – “[o legado de freud] é uma grande revolução, ao lado ddas realizadas por Charles Darwin 91809-1882) e Karl Marx (1818-1883). É difícil pensar que temos um inconsciente, um psiquismo complicado. Freud contribuiu com isso. É imprescindível e vai além do interesse terapêutico da metodologia. No cotidiano, usamos termos como lapso, inconsciente. A ideia de que as pessoas tÊm um inconsciente é amplamente difundida. Meu livro foi traduzido na China, embora quase não existam psicanalistas no país. Por quê? Porque Freud é um grande pensador“.

Daniela Fernandes
Se Setenta e seis anos após a morte de Sigmund Freud, que serão completados em 26 de setembro, o criador da psicanálise continua sendo tema de inúmeros estudos e publicações. Uma nova biografia, “Sigmund Freud – En Son Temps et dans le Nôtre” (Em seu tempo e no nosso), da historiadora francesa Élisabeth Roudinesco, chegará às livrarias brasileiras no começo de 2016 pela editora Zahar.
Lançada no ano passado na França, a obra de Elisabeth, de 592 pátinas é a primeira biografia sobre Freud (1856-1939) escrita por uma grande autoridade francesa na área. O livro já vendeu 25 mil exemplares e será lançado em uma dezena de países entre Turqua e China. Elisabeth restitui, com estilo de romance, o ambiente da Viena onde viveu Freud no fim do século XIX. 

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Elisabeth Roudinesco – historiadora francesa autora de biografia de Sigmund Freud.
Daniela Fernandes – 28.08.2015.
IN Valor Econômico, Ed. Impressa.