Após encerrar 2012 com
avanços no primeiro período de diálogos entre as Forças Armadas Revolucionárias
da Colômbia – Exército do Povo (Farc-EP) e o governo iniciaram uma nova etapa
com expectativas de chagar em acordos concretos.
Luisa María
González
As 21 jornadas iniciais de diálogos encaminhadas para edificar a paz
colombiana conseguiram progressos, enquanto ambos empreenderam o novo ciclo com
solicitações para acelerar o processo. Para a Colômbia, a solução para o
conflito armado que já dura há mais de meio século com um saldo superior a
cinco milhões de vítimas, depende dos diálogos.
A situação qualificada em reiteradas ocasiões como “drama humano”,
inclue cerca de 3,5 milhões de desalojados, 15 mil desaparecidos e milhares de
mortos e mutilados por minas.
Os direitos das vítimas é um dos seis pontos que conforma a agenda,
acordados mediante um processo de conversas exploratória que durou meses e
concluiu com a assinatura de um Acordo Geral para guiar o diálogo e fixar
prioridades.
Os seis assuntos estabelecidos incluem o desenvolvimento rural, as
garantias para a participação cidadã, o fim Fo conflito armado, a solução ao
problema das drogas ilícitas, os direitos das vítimas e os mecanismos de
verificação e referenda do que foi discutido na mesa.
Cuba volta a ser o lugar da reunião das equipes de diálogo, que começou
em 19 de novembro, cujas primeiras jornadas de 2013 destacou-se o tema da
terra, somando os desejos de conseguir mais rapidez ao processo.
Por avanços concretos
com mais rapidez
O desejo de conseguir mais ritmos nos diálogos tem sido expresso tanto
pelas Farc como pelo governo, um indicio da vontade comum de continuar os
avanços e concretizar acordos.
O chefe da delegação da guerrilha, Iván Márquez, pediu maior pressa na
alise profunda e integral do Acordo Geral, pensando nos interesses das maiorias
nacionais, ao mesmo tempo que culminou ao governo de Juan Manuel Santos
apresentar soluções rápidas, tangíveis e apartadas da demagogia.
O grupo governamental “deve demonstrar vontade para avançar, colocando
na mesa propostas claras que indiquem ao país que o governo não prolongará
indefinidamente o tempo das soluções ao grave problema do latifúndio e das
desapropriações de terra com métodos violentos ou disfarçados de legais”,
apontou.
No caso da equipe do governo, o chefe da delegação Humberto de la Calle,
instou a conseguir maior ritmo, porque ao começar um ano novo precisa caminhar
para frente para manter o apoio da cidadania.
“As pessoas querem ver um processo eficaz, digno, rápido, sério. Esta é
uma fase de conseguir resultados para um acordo sobre o fim do conflito, isso é
o que nos traz a mesa. Nosso chamado é esse novo ritmo e buscar, rapidamente,
acordos”.
De la Calle esclareceu que não entrará na discussão o tema do modelo de
desenvolvimento econômico ou a eliminação da propriedade privada, mas que
mantém pontos da agenda acordados pelas partes, pois entendem que eles radicam
a possibilidade de acabar com o conflito.
Tema agrário na
palestra
Desde o começo dos diálogos de paz, o tema da terra foi central por sua
relevância como origem do conflito armado e sua solução constitue condição
indispensável para estabelecer uma paz sólida e duradoura.
As Farc anunciaram a adoção de uma posição preliminar em torno ao
assunto, para resolver a injustiça estrutura latifundiária da posse da terra.
O documento titulado “Dez propostas para uma política de desenvolvimento
rural e agrário integral com enfoque territorial”, propõe a realização de uma
reforma rural e agrária integral, socioambiental, democrática e participativa.
Entre eles destaca-se a transformação das relações rurais para
contribuir com a democratização real do poder territorial, de sociedade, do
Estado e do modelo econômico em seu conjunto, assim como o bem-estar da
população.
O ministro da Agricultura, Juan Camilo Restrepo, para comparecer nos
diálogos e sustentar um projeto legislativo sobre as terra e precisar se
levarão em conta as conclusões dos possíveis acordos para o estabelecimento da
paz estável e duradoura.
As Farc consideraram um contrassenso que enquanto se coloca a discussão
da política de desenvolvimento agrário integral como fundamental para a paz, o
governo insiste em provar uma legislação de terras que “persiste na
determinação de entregar maiores concessões para os latifundiários”.
De acordo com o integrante da guerrilha Jesús Jesús Santrich, eles estão
difundindo os anseios do povo para fazer ouvir, porque “até agora o único que
se escuta é a grande imprensa reivindicando os interesses das transnacionais”.
Em resposta ao pedido dos guerrilheiros, Restrepo afirmou que
corresponde aos porta-vozes participantes no diálogo “reagir, opinar e dar
declarações diante das propostas”. Em comunicado, sustentou que a política
agrária do governo é avançada, audaz e nova e “fará respeitando o direito
privado, a ptopriedade e os direitos adquiridos de boa fé”.
Por sua vez, Humberto de la Calle mencionou que foram impulsionadas
soluções muito concretas para recuperar e transformar o campo. Igualmente,
mostrou-se a favor da participação da sociedade colombiana suas contribuições
nos diálogos de paz.
Ele assegurou que o governo colombiano quer o fim do conflito como o
primeiro passo para avançar na construção de uma paz estável, um cenário no
qual cabem as Farc como partido político legal.
Luisa María
González - Jornalista da Prensa Latina – 20.01.2013
Tradução da redação do Portal Vermelho
(originalmente in Prensa Latina)
A Colômbia continua conversando
Só o fato de o diálogo
entre o governo e as FARC prosseguir já seria uma boa notícia. Alguns detalhes,
porém, indicam que existe razão para reforçar um pouco mais o otimismo dos
otimistas, e para preocupar um pouco mais os preocupados. É que chegou o
momento de debater um dos pontos mais delicados da pauta de temas aceitos pelas
duas partes: a questão da terra. A primeira conversa, em Havana, está prevista
para o dia 8 de janeiro.
Eric Nepomuceno
O ano de 2012 terminou e as negociações entre o governo colombiano e as
FARC – as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, a guerrilha mais longeva
da América Latina – continuam. Só o fato de o diálogo prosseguir já seria uma
boa notícia. Alguns detalhes, porém, indicam que existe razão para reforçar um
pouco mais o otimismo dos otimistas, e para preocupar um pouco mais os
preocupados. É que chegou o momento de debater um dos pontos mais delicados da
pauta de temas aceitos pelas duas partes: a questão da terra. A primeira
conversa, em Havana, está prevista para o dia 8 de janeiro.
O otimismo pode ser reforçado porque o governo do presidente Juan Manuel
Santos parece mesmo disposto a encarar de frente a necessidade de implantar
profundas reformas que levem a uma nova política rural. E a preocupação
reforçada se deve exatamente a isso: qualquer passo rumo a uma reforma agrária
mexerá nos interesses daqueles que estão dispostos a ir às últimas
consequências para assegurar a manutenção de um sistema que permite que 1,5% de
proprietários tenham 52% das terras cultiváveis no país. Convém lembrar que uma
das razões fundamentais para a guerra que dura décadas na Colômbia diz respeito
exatamente à terra. Tanto assim, que é este o primeiro ponto da agenda de negociações
entre as FARC e o governo.
Em novembro agora, foi realizado em Bogotá um grande encontro, reunindo
mais de 1.300 participantes de todas as classes e segmentos sociais, além,
claro, dos chamados empresários do campo – os grandes proprietários. E deu para
perceber claramente que a questão é muito delicada, e que esse debate irá
longe.
Os poderosos pecuaristas, por exemplo, não estão nada dispostos a
dialogar com os pequenos proprietários, em geral agricultores. O desequilíbrio
de forças é gritante: calcula-se que cerca de cinco milhões de hectares são
destinados, na Colômbia, à agricultura, enquanto a pecuária ocupa quase 39
milhões. Essa concentração extrema responde exatamente às distâncias que
separam pequenos agricultores e imensos complexos de pecuária.
Os obstáculos para as negociações entre guerrilha e governo são muitos e
muito difíceis de superar, e todos sabem disso na Colômbia, a começar, é claro,
pelos negociadores. Os setores mais recalcitrantes da direita colombiana acham
um absurdo tratar temas como distribuição de terras com guerrilheiros. E outro
absurdo é tratar com milhares de pequenos agricultores, vítimas da violência,
que não só querem sua terra de volta como serem compensados. Falar em reforma
agrária, então, nem pensar.
Seja como for, o que está acontecendo agora na Colômbia é que os dois
lados – grandes empresários rurais e pequenos agricultores – conseguiram
conversar. Os que se recusam a discutir propriedade privada e economia de
mercado e os que querem que se ponha um limite claro à concentração da terra
estão conversando, e isso é inédito no país que há décadas padece uma epidemia
de violência.
Dessa conversa insólita saíram subsídios para a negociação política que
acontece em Havana, entre representantes do governo e da guerrilha. Pode parecer pouco. Talvez seja pouco. Mas é muito mais do que se conseguiu nas tentativas anteriores de se chegar a um acordo de paz.
acontece em Havana, entre representantes do governo e da guerrilha. Pode parecer pouco. Talvez seja pouco. Mas é muito mais do que se conseguiu nas tentativas anteriores de se chegar a um acordo de paz.
Falta muito, é verdade. A começar pela negativa do setor pecuário, que
se recusou terminantemente a participar, como coletivo, desse grande encontro
realizado em Bogotá. O presidente colombiano criticou os representantes do
setor, e disse que achava ‘irracional’ essa recusa, já que justamente os
pecuaristas são um dos lados mais afetados pela guerra.
Talvez Juan Manuel Santos tenha se esquecido de um detalhe: muitos dos
grandes pecuaristas são aliados ou diretamente cúmplices dos paramilitares que
espalham o terror pelo interior da Colômbia, expulsando pequenos agricultores e
incorporando suas parcas terras às imensas extensões dedicadas ao gado. O
próprio presidente do grêmio pecuarista, José Félix Lafaurie, é suspeito de
financiar grupos paramilitares. Não há nada de irracional, portanto, em sua
recusa ao diálogo.
Para a guerrilha, o destino da Colômbia passa pela questão da terra.
Para os grandes latifundiários, também. O problema é que cada lado tem sua
própria visão de destino que pretende para a Colômbia.
Governo e guerrilha estão dialogando. Os latifundiários da pecuária
acham isso perda de tempo. Se negam a aceitar que o governo de Juan Manuel
Santos parece ter entendido que, sem diálogo, não se chega a lugar algum.
O tema da terra é o primeiro da agenda, e talvez o mais crucial. Depois
dele, restam outros quatro pontos: a participação política da guerrilha
desarmada, o fim do conflito, a questão das drogas e a reparação às vítimas.
Há, sim, muito caminho pela frente. E, pelo menos por enquanto, parece
haver muita disposição para caminhar.
Eric Nepumuceno – Jornalista e escritor – 31.12.2012
IN Carta Maior – http://cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21457