Além de impedir avanços
progressistas no Congresso, os evangélicos replicam, no varejo político local,
os mesmos debates. E retrocessos.
(...)
Para mulheres, gays e adeptos de
religiões de matrizes africanas, mais grave do que o avanço sobre o poder
público é o impacto social na vida dessas minorias.
Rodrigo Martins e Willian Vieira
Na última sexta-feira
12, na sede da Primeira Igreja Batista de Campo Grande (MS), um exército de
homens de terno e gravata com Bíblias a tiracolo se reuniu para um evento. Não
era propriamente um culto. Entre os 350 pastores havia 25 parlamentares, como a
vereadora Rose Modesto (PSDB), liderança da bancada evangélica local e autora
da lei que obriga o poder público a apoiar eventos evangélicos. Herculano
Borges (PSC), que aprovou projeto para proibir a instalação de máquinas de
preservativos nas escolas, e Alceu Bueno (PSL), opositor do reconhecimento de
uma associação de travestis como de utilidade pública, também vieram. Mas o
nome mais aguardado era o do pastor Wilton Acosta. Ali para abrir o Encontro
Estadual de Lideranças Evangélicas, o presidente do Fórum Evangélico Nacional
de Ação Social e Política (Fenasp) prestigiava ao mesmo tempo a criação da
Frente Parlamentar Evangélica da cidade. Daí os melhores pastores locais
estarem dispostos em fila, como soldados da batalha maior: “Alinhar os
evangélicos para disseminar valores cristãos por meio de leis políticas
públicas”.
O evento é sinal de um
fenômeno bem maior. Enquanto os holofotes da sociedade civil e da imprensa
focam na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, desde
o mês passado presidida por um pastor, Marco Feliciano (PSC-SP), que já fez
declarações homofóbicas, racistas e machistas, um processo mais silencioso se
alastra pelo País. Nos moldes da Frente Parlamentar Evangélica do Congresso,
com seus73 parlamentares, o número de bancadas evangélicas em assembleias
legislativas e câmaras municipais, em capitais e cidades do interior, tem
disparado. Já há frentes parlamentares evangélicas (FPEs) organizadas em 15
estados brasileiros, a maioria criada desde 2012. São mais de cem os deputados
estaduais evangélicos organizados. Já o número de FPEs nos municípios é difícil
de calcular. “A expectativa é passar de 10 mil vereadores evangélicos”, garante
Acosta.
Espécie de tutor do
movimento, o pastor coordena um levantamento dos parlamentares ligados à causa
em todo o Brasil. Prestes a entrar num voo para o Acre, ele afirma: “O objetivo
é verticalizar a pauta parlamentar nacional, aprovando leis em todas as
assembleias e câmaras. Todas”. Com oratória fluida e vertida em termos
jurídicos, Acosta explica como deve instalar um braço da Associação de
Parlamentares Evangélicos do Brasil (Apeb) em cada cidade. “Já temos 15
coordenações estaduais. Logo serão 28. Cada coordenador tem a missão de
instalar uma unidade em toda cidade de seu estado. Hoje, quando detectamos um
projeto contra nossos valores, contatamos o parlamentar para agir. Mas leva
tempo. No futuro será automático.”
A verticalização é
levada a sério. Em 30 de novembro, Dia do Evangélico em Brasília, 700 líderes
de 20 estados, boa parte parlamentares e juristas, se reuniram para decidir,
com toda sua modéstia, os rumos do País. Representantes da Apeb e do Fenasp
leram seus relatórios de atividades. Deputados federais da FPE do Congresso
falaram de suas experiências. Daí emergiu a "agenda estratégica nacional",
que deve pautar as ações de políticos evangélicos nos níveis estadual e
municipal. Entre os pontos estão impedir os avanços nos códigos Penal e Civil,
envolvendo aborto, posse de maconha, criminaização da homofobia e casamento
gay. "Para trazer o nacional para o local, faremos mais encontros em todo
o País", afirma o vereador Herculano Borges (PSC), primeiro-secretário da
Apeb. "A ide ia é subsidiar os vereadores com fundamentos legais, para que
ajam de forma local." Ou seja, lutar contra o "avanço" dos
movimentos gays e feministas. "Quando barramos as propostas deles no
Congresso, eles tentam implantá-las nas cidades e estados. Aí criam
jurisprudência. Não vamos permitir isso."
O mesmo tem ocorrido no
âmbito estadual. Ao liderar o movimento que criou, em 2011, a Frente
Parlamentar Evangélica da Assembleia de São Paulo, o deputado Carlos Cezar
(PSC) deixou claros os objetivos: ser contra a descriminalização da maconha, o
casamento gay e o aborto. "Não somos bobos. Sabemos que são temas de
competência do Congresso, mas o que falamos aqui repercute em Brasília. Afinal,
os deputados federais e senadores se elegem com apoio de deputados estaduais e
vereadores. A base tem direito de cobrar uma postura firme deles no
Parlamento." Hoje, 15 dos 94 deputados paulistas integram o movimento
evangélico.
Atuamente, há duas
frentes na batalha dos evangélicos na política. Uma volta-se aos interesses
institucionais e simbólicos. O objetivo é conseguir dividendos para as igrejas,
como manter o status quo das leis de radiodifusão, arrebanhar pedaços de ruas
para templos, não pagar IPTU e instituir leis que reconheçam a cultura
evangélica e forcem a abertura dos cofres públicos a tais eventos, assim como
conseguir maior espaço simbólico, como nomear praças e logradouros com símbolos
religiosos e instituir feriados como o Dia do Evangélico. Exemplos abundam. O
próprio Borges ajudou a aprovar um projeto que reconheceu a música gospel como
manifestação cultural, o que abriu espaço para a prefeitura financiar a Quinta
Gospel e a Marcha para Jesus. "Hoje conseguimos ajuda para contratar os
músicos, montar a estrutura." Proposição do vereador João Oscar (PRP)
autorizou a prefeitura de Belo Horizonte a vender uma rua para a expansão da
igreja que freqüenta. Em São Paulo, a Câmara aprovou em 2012, às vésperas da
eleição, um projeto que permite à Igreja Mundial em Santo Amaro ocupar uma rua.
Diz-se que a aprovação veio em troca do apoio a José Serra (PSDB). No Recife,
foi aprovada a lei que institui a Semana da Cultura Evangélica, obrigando a
Secretaria de Cultura a promover (e financiar) debates, "palestras em
instituições de ensino" e "apresentações artísticas em praças
públicas".
Proibir bares a menos de
300 metros de igrejas foi a proposta do vereador de Sorocaba Benedito Oleriano
(PMN). Os fiéis precisavam "de paz para orar". O mesmo levou uma vara
de marmelo à Câmara para defender o direito dos pais de bater nos filhos. Com o
Livro dos Provérbios em mãos, sentenciou: "Não retires a disciplina da
criança, porque, fustigando-a com a vara, nem por isso morrerá. Tu a fustigarás
com a vara e livrarás sua alma do inferno". Enquanto isso, os evangélicos
de Maringá conseguiram, via projeto de lei, transferir a data da Marcha para
Jesus para coincidir com a Parada Gay, e a Câmara do Rio concedeu ao pastor
Silas Malafaia a medalha Pedro Ernesto, dada a quem se destaca na sociedade.
Provas da ocupação do
discurso e dos espaços públicos pela religião. Assim, era uma vez uma Praça
Chico Mendes em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio. Homenagem ao ativista
morto na Amazônia, o espaço foi convertido pela prefeita evangélica Aparecida
Panisset em Praça da Bíblia. "Antes essa praça era relacionada a crimes e
hoje manifesta a palavra de Deus", disse no evento. Igualmente simbólico,
o Dia do Evangélico foi aprovado em dezenas de cidades. Mas o que mais preocupa
os laicos é a frente da ação voltada para projetos de cunho moral, em prol de
um ideário conservador de nação, família e vida. Não foi apenas Carlos
Apolinário (DEM) a propor a instituição do Dia do Orgulho Hétero e o banheiro
gay em São Paulo. Em Ilhéus (BA), o vereador Alzimário Belmonte (PP) tentou
transformar em lei a obrigatoriedade do Pai-Nosso antes das aulas. Projetos
mais esdrúxulos pipocam País afora.
Para tal, os evangélicos
dependem dos números. E têm conseguido. Há casos emblemáticos, como a pequena
São Leopoldo (RS), onde seis dos 13 vereadores São evangélicos (PRB, PSB, PP.
PT, PSL e PSDB), um crescimento de 100% em relação à última legislatura. Em
cidades maiores, o fenômeno é o mesmo. No Rio eram quatro evangélicos na última
gestão: hoje são sete, aumento de 75%. Em São Paulo, o número subiu de oito
para 11. Em Aracaju eram dois, agora são quatro. No Recife, eram seis, e agora
são 11. Em Curitiba, a bancada surgiu em 2013 com 11 vereadores: quase um terço
da casa. A regra é clara: sem maioria para aprovar seus projetos, os
evangélicos formam alianças e usam a barganha política para impedir propostas
progressistas.
Embalado pelo
crescimento da bancada, o vereador sindicalista evangélico Luiz Eustáquio (PT)
criou uma FPE na Câmara do Recife. Entre os temas discutidos estão formas de
impedir o aborto, a legalização da maconha e o casamento gay, explica o
vereador, recém-chegado de um encontro da FPE no Congresso, em Brasília.
"Fui lá me inspirar e aproveitei para participar do culto na Câmara."
Mas temas do Congresso cabem no âmbito municipal? "E importante replicar
os temas aqui para fortalecer o debate nacional." Um exemplo é a Lei do
Nascituro. Um projeto tramita na Câmara para estabelecer os direitos dos
embriões. "Talvez caiba propor algo municipal." O mesmo Dia do
Nascituro foi aprovado em dezenas de cidades, o que leva o poder público a
investir em palestras e seminários que ataquem a legalização do aborto.
"A gente tem
observado a replicação desses projetos no âmbito do Congresso também nos
estados e municípios", diz Kauara Rodrigues, assessora parlamentar do
Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA), ONG que monitora no
Congresso Nacional projetos relativos aos direitos das mulheres. Das 33
proposições em tramitação hoje, 30 trazem retrocesso, a maioria de autoria da
bancada evangélica, afirma. O mesmo ocorre em , âmbito municipal. "O
avanço dos evangélicos tornou a luta muito mais desfavorável." Pois, além
de propor leis que impedem o avanço da legislação reprodutiva, as FPEs têm
centrado fogo na fonte de recursos das ONGs. Dias atrás, deputados requereram
uma CPI para "investigar a existência de interesses e financiamentos
internacionais para promover a legalização do aborto no Brasil". Exigir
transparência é parte da prática democrática.
"O problema é
quando essas ações servem não para punir um grupo, mas para negar políticas
públicas para segmentos que legitimamente, por razões históricas, se sentem
excluídos", alerta Marilene de Paula, coordenadora de direitos humanos da
Fundação Heinrich Bõll.
Para mulheres, gays e
adeptos de religiões de matrizes africanas, mais grave do que o avanço sobre o
poder público é o impacto social na vida dessas minorias. "Há uma
capilaridade grande dessas igrejas nas periferias" diz Rodrigues. "A
pauta é sempre conservadora. A mulher vai ao culto e ouve o pastor pregar
contra a camisinha, os homossexuais, dizer que lugar de mulher é satisfazendo o
marido." C) Censo reitera o crescimento do pente-costalismo na base da
pirâmide social: 64% do grupo ganha até um salário mínimo e 42% tem ensino
fundamental incompleto. "É nessas periferias desassistidas que essas
igrejas acabam servindo como fronteira moral, como fortaleza contra o tráfico
de drogas e a violência", diz o sociólogo Ricardo Mariano, da PUC-RS.
"Ao servir de suporte comunitário, ganham espaço para implantar sua agenda
moralizante."
Os símbolos do
retrocesso em questões de liberdade sexual ligados à religião pululam não
apenas nas igrejas como na internet. Há uma miríade de blogs a monitorar
projetos de lei e ações do Executivo e vídeos gravados direto do púlpito, como
o famoso "Como ser submissa a uma pessoa omissa?" Um exemplo mais
radical chegou aos ouvidos de Rodrigues. A jovem Noêmia chegou em casa após ir
ao bar com os amigos. O irmão achou que ela estava possuída pelo demônio e
chamou três amigos evangélicos da rua, que oraram, arrancaram seus piercings e
lhe deram uma surra de Bíblia. A garota procurou o CFEMEA, que encaminhou o
caso à Secretaria de Direitos Humanos. Outra cena chocante aconteceu em Olinda.
Centenas de evangélicos com faixas protestaram em frente a um terreiro de
umbanda. Testemunhas garantem que houve depredação e ameaças de morte.
Mais do que ninguém, os
homossexuais têm fatia mais farta desse retrocesso. Não apenas as FPEs travam
luta cerrada contra a criminalização da homofobia e associam homossexualismo à
pedofilia como o deputado tucano João Campos, presidente da frente evangélica
no Congresso, propôs que a resolução do Conselho Federal de Psicologia, que não
permite "cura" aos gays, fosse revogada. "Temos de aprovar leis
como no México, onde quem exerce função religiosa fica impedido de exercer
função governa mental", defende Toni Reis, da Associação Brasileira de
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. "Assistimos hoje a um
aumento visível da homofobia no Brasil, o que tem uma ligação direta com essa
onda de incentivo ao ódio e à intolerância." Exemplos da pressão
evangélica, diz, foram a suspensão do material educativo do projeto Escola sem
Homofobia (o "kit gay") e o veto presidencial à campanha de prevenção
da Aids a jovens gays no carnaval.
No governo, o assunto é
tabu. Não apenas a presidenta Dilma Rousseff tem se mantido silente diante da
polêmica a envolver Marco Feliciano como presidente da Comissão de Direitos
Humanos e Minorias como a Secretaria de Políticas para as Mulheres não se
pronuncia sobre o tema. A titular da pasta, Eleonora Menicucci, é abertamente a
favor do aborto. Sua indicação foi vista como afronta pelos evangélicos. Mas
seu silêncio incomoda ainda mais as feministas. A Secretaria de Diretos Humanos
tampouco respondeu a questões sobre o tema. O silêncio é total.
Mas qual é, afinal, o
poder de fato dos parlamentares evangélicos sobre o futuro moral do País?
"Não dá para subestimar o voto evangélico nem a organização política das
igrejas", diz Ari Oro, professor de antropologia da religião da UFRGS e
autor de Os Votos de Deus: Evangélicos, política e eleições no Brasil. "Se
esse crescimento vai continuar dependerá da organização das próprias igrejas."
O professor cita o caso da Igreja Universal do Reino de Deus, tratado por
outras como modelo de gestão política. Sua cúpula dirigente decide,
verticalmente, quais os candidatos em cada eleição e quantos, para evitar a
repartição de votos. "Já ouvi pastores de igrejas menores dizendo que é
preciso adotar o modelo da Universal." Se outras igrejas se organizarem de
modo a garantir a transformação dos fiéis em candidatos eleitos, a tendência é
uma participação cada vez maior de evangélicos na política.
Igreja com a maior
representação evangélica no Congresso (24 deputados), a Assembleia de Deus
preparou, em 2010, uma ofensiva para as eleições municipais. Queriam eleger um
vereador em cada um dos 5.570 municípios. "Infelizmente, não atingimos a
meta. Mas 60% das cidades têm ao menos um vereador ligado à nossa igreja",
afirma o pastor Lélis Washington Marinhos, presidente do conselho político da
Convenção Geral das Assembléias de Deus no Brasil. Para o Censo, há 12 milhões
de fiéis da Assembleia, igreja que mais cresceu nos últimos dez anos: 4 milhões
de novos adeptos. "Mas somos entre 18 milhões e 20 milhões. Por isso
entendemos que estamos sub-representados. Deveríamos ter ao menos 50 deputados
federais/" Isso porque o engajamento político dos assembleianos começou há
menos de 20 anos. A igreja existe desde 1910. "Os pastores eram
refratários à política, mas as igrejas dependem do poder público para ter
alvarás, licenças para obras, verbas para tocar projetos sociais", lista.
"Sem falar dos projetos que ameaçam a família."
Não que essa guinada
moral seja prerrogativa exclusiva dos evangélicos. "Eles vocalizam esse
conservadorismo que acaba pulverizado na sociedade e no Congresso",
pondera a professora Maria das Dores Machado, da UFRJ. Oro, da UFRGS, concorda.
"Desde a Constituinte de 1988, a Igreja Católica tentou formar um bloco
parecido, nos mesmos moldes." A Renovação Carismática tem eleito políticos
todos os anos, ainda que menos do que a Universal, por exemplo. "Sempre
que a discussão tem base moral, se envolve a vida, a família e os costumes,
evangélicos e católicos se unem." Exemplo é a criação das chamadas
"frentes da família", com católicos e evangélicos lado a lado.
Mas a política dita
laica também tem responsabilidade. "A esquerda, desde 2002, fez alianças
fortes com os neopentecostais, misturando grupos feministas e pró-homossexuais
com segmentos religiosos ultraconservadores, o cúmulo do pragmatismo", diz
Mariano. Um cenário difícil de mudar. De 2000 a 2010, a população evangélica
arrebanhou 16,1 milhões de fiéis, somando 42,3 milhões de brasileiros. Uma
multidão encabeçada por dezenas de igrejas, cada uma com seus canais de rádio e
tevê. Só a Universal, estima-se, é dona de 20 canais de tevê e 40 emissoras de
rádio.
"Não por acaso,
parlamentares temem irritar esses grupos e provocar um boicote ou reação desse
poderio midiático", avalia Mariano. Assim, a influência evangélica na
política se dá não apenas pelo confronto direto nas sessões, mas por meio de
uma espécie de tática de não agressão. "Daí você entender por que RR
Soares e José Wellington têm sempre os tapetes vermelhos dos executivos de
estados e municípios e mesmo do Planalto. Isso cristalizou a legitimação do
ativismo político religioso no Brasil."
Uma das últimas vitórias
do segmento foi o projeto de lei que prevê o pagamento de um salário por 18
anos a mulheres estupradas, batizado de "Bolsa Estupro". Pelo
projeto, psicólogos cristãos atenderiam as vítimas para convencê-las
"sobre a importância da vida". Tudo pago pelo Estado. Pensando nisso,
a procuradora do município de São Paulo, Simone Andréa Barcelos Coutinho,
defende uma reforma no código eleitoral que acabe com as bancadas religiosas.
"Se tivéssemos uma Constituinte hoje, o texto dela resultante seria
certamente muito mais conservador, em nada parecido com a Constituição Cidadã
que hoje temos e com a qual o STF nos tem socorrido."
Na avaliação do pastor
Ricardo Gondim, líder da Igreja Betesda, a corrida política dos evangélicos é
reflexo da disputa entre as igrejas no mercado religioso. "Elas querem ter
cada vez mais fiéis e mais representantes políticos. Mas parecem esquecer que a
expansão do protestantismo só foi possível com a conquista do Estado
laico." Acusado pelo mainstream evangélico de ser "herege" por
defender que temas como o casamento gay e o aborto devem ser vistos como
questão de direitos civis e saúde pública, respectivamente, Gondim teme que o
radicalismo evangélico ameace a liberdade religiosa no País. "Assim como
não quero um burocrata de Brasília dizendo o que posso dizer em meu púlpito, o
Legislativo e o Judiciário não podem tomar uma decisão para agradar a este ou
àquele grupo religioso. Queremos ter uma teocracia?"
Mas há limites à
ascensão conservadora. Primeiro, porque os evangélicos mais radicais tendem a
não emplacar candidatos em eleições majoritárias, visto a rejeição da sociedade
laica a pautas morais extremas. Segundo, porque o voto dos evangélicos já não
está mais confinado na direita como outrora. "Hoje, os votos dos
evangélicos estão distribuídos em diversos partidos, algo que tende a
prosseguir", diz o sociólogo André Ricardo Souza, da UFS-Car. "Com
maior acesso a programas sociais, renda e educação, a autonomia dessas pessoas
tende a aumentar. Por isso, não vejo um futuro teocrático fundamentalista evangélico."
Rodrigo Martins e Willian Vieira – 19.04.2013