Nos anos 1880, porém, a auto-confiança arrogante da
classe dominante britânica ficou balançada. O mundo estava mergulhado em uma
depressão que já durava uma década e que afetava os lucros dos empresários. A
agricultura havia sido gravemente atingida, especialmente na Irlanda. Fome,
despejo e forte desemprego angustiavam os trabalhadores.
Surge a resistência. Nacionalistas irlandeses
procedem a campanhas de guerrilha, inclusive no próprio Reino Unido. Operários
entram em greve nas tecelagens de algodão de Lancashire e nas minas de carvão
de Northumberland, Escócia.
Max
Altman
No dia 13 de novembro de 1887, a Polícia
Metropolitana promoveu um selvagem ataque contra uma manifestação de
desempregados em Londres. Manifestantes, movendo-se em colunas de diferentes
partes da cidade, foram separadamente atacados ao se aproximarem da Trafalgar
Square. Foram agredidos com cassetetes e porretes e afugentados para as ruas
laterais. As faixas foram apreendidas, os cartazes rasgados e as bandeiras
destruídas. Aqueles que insistiram em chegar à praça foram acuados pelos
cavalos da polícia. Muitos foram presos. Dois homens, gravemente feridos,
vieram a falecer. O episódio foi imediatamente alcunhado de o “Domingo
Sangrento”.
A manifestação foi vista como uma virada
crucial do novo movimento socialista e, para enfrentá-lo, inaugurou-se uma
tática de repressão mais dura e brutal.
A Federação Democrática havia sido fundada
pouco antes, em 1884. Tornou-se logo a seguir Federação Social Democrata e, em
1885, sofreu a sua primeira cisão quando um grupo chefiado por William Morris,
Eleanor Marx e Tom Mann criou a Liga Socialista. Membros de ambas as
organizações pertenciam também à Sociedade Fabiana. Radicais não-socialistas,
nacionalistas irlandeses e até alguns membros do Partido Liberal também estavam
envolvidos.
Apenas uns poucos membros mais velhos
lembravam os dias do Cartismo. Aquelas batalhas foram seguidas por anos de
prosperidade vitoriana. Havia uma quantidade de lutas laborais setoriais,
especialmente conduzidas por operários especializados. Não havia sido formado
ainda qualquer organização socialista que pudesse liderar as preocupações
cotidianas dos trabalhadores.
Nos anos 1880, porém, a auto-confiança
arrogante da classe dominante britânica ficou balançada. O mundo estava
mergulhado em uma depressão que já durava uma década e que afetava os lucros
dos empresários. A agricultura havia sido gravemente atingida, especialmente na
Irlanda. Fome, despejo e forte desemprego angustiavam os trabalhadores.
Surge a resistência. Nacionalistas irlandeses
procedem a campanhas de guerrilha, inclusive no próprio Reino Unido. Operários
entram em greve nas tecelagens de algodão de Lancashire e nas minas de carvão
de Northumberland, Escócia. Demonstrações contra o desemprego tornam-se comuns.
Neste cenário, o novo movimento socialista é
fundado e cria raízes. Muitas personalidades a ele se filiam como Eleanor Marx,
George Bernard Shaw e Beatrice Webb. Mas também atraía um bom grupo de jovens
agitadores como os engenheiros Tom Mann e John Burns e o foguista Will
Thorne, que subiam para os discursos em caixotes de madeira nos cais de
Londres.
Em 1885 a repressão policial invadiu o
International Club em Londres e fez com que vários de seus membros fossem
presos. Manifestações no East End eram dissolvidas. Porém tiveram alguns
grandes sucessos: em fevereiro de 1886, dezenas de milhares dirigiram-se à
Trafalgar Square a fim de protestar contra a situação dos trabalhadores na
Irlanda. No domingo de Páscoa de 1887, os socialistas participaram do que
Engels avaliou como “seguramente o maior ato público de trabalhadores de todos
os tempos na Inglaterra”. Cerca de 150 mil pessoas convergiram para o Hyde
Park. A resposta da classe dominante foi a renovação da Lei de Crimes que
suspendeu todos os direitos civis dos irlandeses.
Os sinais de rápido crescimento das massas
nas ruas assustaram os governantes. No final do verão aumentaram a repressão.
Um novo governo conservador estava determinado a manter a ordem.
O novo chefe de polícia, Charles Warren,
começou por proibir qualquer reunião na Trafalgar Square. Seus agentes levaram
a cabo batidas e prisões sumárias por toda a cidade. Os nacionalistas
irlandeses e os radicais convocaram uma demonstração na Trafalgar Square para
13 de novembro. Os socialistas se encarregaram de mobilizar os trabalhadores em
várias partes do East End. Milhares de policiais armados se concentraram na
praça. Um observador neutro viu quando o líder socialista e membro do
Parlamento, Cunningharn Grahame, foi cercado pela polícia: “Após a prisão de
Grahame, um policial atrás de outro, penso que dois, avançaram por detrás e o
golpearam na cabeça com violência e brutalidade. Era chocante de se ver. Depois
disso cinco ou seis outros policiais arrastaram-no pela praça, um deles
puxando-o pelos cabelos de modo a trazer a cabeça bem para trás.”
Os acontecimentos não intimidaram o
movimento. Ao contrário, inspiraram-nos a retaliar. Manifestantes desafiaram no
domingo seguinte a força policial, reagindo aos golpes. Durante o ataque, um
jovem trabalhador socialista, Alfred Linnell, foi derrubado e pisoteado por um
cavalo da polícia, vindo a falecer pouco depois no hospital. Seu funeral
em dezembro transformou-se no maior evento político organizado pelos
socialistas. Teve a presença das mais importantes figuras da esquerda, porém,
mais importante, assistido por dezenas de milhares de trabalhadores vindos dos
bairros operários de Londres numa marcha assistida por outros milhares durante
o percurso.
Tanto Engels quanto William Morris
consideraram os acontecimentos do Domingo Sangrento e seus desdobramentos como
um momento crucial, inclusive para os órgãos repressores, e uma lição profunda
sobre o poder de Estado. Muitos dos manifestantes correram para evitar
ferimentos ou prisão. Outros julgaram que a única possibilidade de reformar o
sistema seria trabalhar “pacificamente” por dentro. A conclusão dos
revolucionários socialistas era de prosseguir na confrontação, porém
conquistando mais e mais adeptos e desenvolvendo melhores métodos a fim de
derrotar o regime.
Nas palavras de Morris gravadas na lápide de
Alfred Linnell: “É nossa missão começar a nos organizar com o propósito de
prever que tais coisas não aconteçam e tentar e fazer desse mundo um lugar belo
e feliz”.
Max
Altman – 13.11.2012
IN “Opera Mundi” – http://operamundi.uol.com.br/conteudo/historia/25404/hoje+na+historia+1887+-+em+londres+policia+reprime+protesto+de+trabalhadores+e+deixa+dois+mortos+.shtml