terça-feira, 20 de maio de 2014

A corrupção deles


‘Petralhas, ‘tucanalhas’... É o roto que censura o rasgado e vitupera a si próprio. Desde quando é virtude denunciar nos outros o vício que dissimulamos em nós?

Carlos Melo
Este parágrafo será longo. Para não ser injusto com o judas da vez, é bom lembrar que recordar é mesmo viver e, no caso, morrer de raiva. Há maracutaias para todos os gostos; uma sopa de letrinhas com todo um alfabeto de legendas. Nem só de fiscais inexplicavelmente milionários, na transição entre PSD e PT, se escreverá a crônica política do nosso tempo. A verdade é que escândalos não faltam, a começar, é claro, pelo célebre mensalão petista. Mas seria desonesto omitir o caso do cartel no metrô e na CPTM, em São Paulo, que envolve os tucanos e constrange até o intrépido Ministério Público, MP. A recente produção de esterco bateu recordes, pois há outros mensalões, em Minas (PSDB) e em Brasília (DEM); há Carlinhos Cachoeira e o impetuoso Demóstenes Torres (DEM); há Paulo Maluf (PP), artista veterano - um clássico -, agora oficialmente lavrado ficha suja; há as relações obscuras entre Sérgio Cabral (PMDB) e a Construtora Delta; há a soberba euforia de Eike Batista e sua OGX; há Rosemary Noronha e as ligações perigosas que oculta (PT); há o vertiginoso enriquecimento de Hussain Aref Saab e as aprovações de empreendimentos imobiliários em SP (PSD). Mais distante no tempo, houve anões, lalaus, precatórios, fitas... Difícil mencionar todos. Há tantos!
Casos não faltam. Não se trata de prejulgar; todos poderão se defender. Oxalá sejam inocentes! Cientistas políticos hoje respondem a processos por mencionar casos que estão nas manchetes; então, todo cuidado é pouco. Mas aquele que se dedicar a caçar exemplos no Google ficará abarrotado de trabalho. Para quem, em 1984, acalentou sonhos de democracia, o resultado da pesquisa é mesmo um pesadelo: será que aquilo deu mesmo só nisso? Claro que não. Mas o sentimento de frustração é evidente. O rio está poluído e mesmo quem defende as águas da política como atividade nobre - que precisa ser recuperada pela cidadania, etc. e tal - fica sem palavras. Dizer que não é bem assim? Não é mesmo bem assim, mas diante dos fatos, faltam argumentos.


Carlos Melo – Cientista Político, professor do INSPER – 09.11.2013
IN O Estado de São Paulo.