Fórum Social
Temático 2012 marca início das mobilizações pela Cúpula dos Povos (Junho no RJ);
ideia é que a sociedade vá às ruas em defesa da justiça socioambiental
Sucena
Shkrada Resk
O Fórum Social Temático 2012 – Crise
Capitalista, Justiça Social e Ambiental – teve um papel mobilizador na
articulação dos movimentos sociais para a preparação da Cúpula dos Povos na
Rio+20 Por Justiça Social e Ambiental. O Comitê Facilitador da Sociedade Civil,
responsável pelo evento, que será promovido no Rio de Janeiro, de 15 a 23 de
junho deste ano, escolheu estrategicamente a ocasião para o anúncio oficial do
encontro, apresentado a um público estimado de 1,5 mil pessoas, ativistas
brasileiros e de outros países, principalmente da América Latina. De acordo com
a organização, a partir de agora o xis da questão é como sensibilizar a
sociedade e buscar apoio para implementar as atividades.
A programação será dividida entre grandes
mobilizações nas ruas, atividades autogestionadas e assembleia permanente dos
povos. A ideia é que não fique circunscrita somente à região do Aterro do
Flamengo, onde devem ser promovidas as principais atividades e que abrigará a
Aldeia da Paz, onde os participantes tenham a opção de montar barracas e
alojamentos. Para isso, a agenda recebe um reforço em escala global. O FST 2012
incorporou propostas de movimentos que hoje têm maior visibilidade mundial e
estiveram representados no encontro, como os Indignados, o Occupy Wall Street,
ativistas da Primavera Árabe e estudantes chilenos. A convocação em rede é para
que a sociedade mundial vá às ruas manifestar-se pacificamente contra o
capitalismo e em defesa da justiça socioambiental, no dia 5 de junho – Dia
Mundial do Meio Ambiente. No dia 20, também está prevista uma grande marcha na
capital fluminense e em outras localidades do país.
No Comitê Facilitador da Cúpula dos Povos,
participam atualmente mais de 30 organizações e redes de caráter internacional,
segundo Carmen Foro, secretária de Meio Ambiente da Central Única dos
Trabalhadores (CUT) e do Grupo de Articulação do Comitê Facilitador. “Existe a
proposta de se incorporar novas organizações. Em momento de crise mundial e do
capitalismo, é um grande desafio se construir a unidade na diversidade.
Pensamentos diferentes devem ser respeitados, mas é possível ter uma pauta
comum. Lutas anticapitalistas, contra homofobia, ações patriarcais, além da
luta socioambiental, pela justiça climática e soberania alimentar.”
Rio+20:
processo oficial
Pedro Ivo de Souza Batista, representante do
Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento (FBOMS) no Comitê Facilitador, explicou que a meta é que a
Cúpula dos Povos não se resuma a uma “grande festa popular”, mas que possa
influenciar na decisão dos governantes, durante as negociações oficiais da
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio+20, que
reunirá chefes de Estado e representantes de cerca de 200 países, de 20 a 22 de
junho, no Rio Centro, no Rio de Janeiro. Esse encontro terá como temas centrais
a economia verde no contexto do combate à pobreza e a governança da
sustentabilidade.
O Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente lançou o documento Green Economy, abordando o conceito de economia
verde, e mais recentemente a ONU publicou o relatório “Trabalhando por uma
Economia Verde, Equilibrada e Inclusiva”. Para a Declaração da Assembleia dos
Movimentos Sociais, no FST 2012, o termo “economia verde” gera desconfiança, e poderia
resultar em mercantilização, privatização e financeirização da vida. Em relação
a isso, um consenso está longe de ser alcançado.
Segundo a ministra do Meio Ambiente, Izabella
Teixeira, antes desse encontro da agenda oficial da Organização das Nações
Unidas (ONU), representantes da sociedade civil cadastrados oficialmente no
órgão têm oportunidade de se manifestar. “Participarão de mesas de diálogo pela
sustentabilidade, no período de 16 a 19 de junho, com os governos, e entre os
dias 13 e 15 acontecerá a fase preparatória da conferência”. Ela ainda adiantou
que a economia verde será discutida com a União Internacional dos
Trabalhadores, durante o evento.
Mas enquanto as organizações civis tentam
encontrar maneiras de pressionar os governantes para a busca da
sustentabilidade do planeta, em Nova Iorque, participantes do processo oficial
da Rio+20 (representantes de nações e de ONGs), se debruçaram do dia 25 a 27
para analisar o chamado draft zero (primeiro rascunho) do documento oficial “O
futuro que queremos” a ser apresentado no encontro, no qual constam atualmente
um número superior a cem tópicos, que já causam controvérsias entre
especialistas. Deverá haver mais rodadas até a redação do texto final.
O documento propõe dez grandes eixos
temáticos, sem se aprofundar nos mesmos: acesso à água, agricultura, cidades
sustentáveis, empregos verdes, energia, inclusão social, oceanos, segurança
alimentar, trabalho decente e redução de riscos de desastres naturais. Estão
sendo considerados como Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, que deveriam
nortear as políticas dos países a partir de 2015, quando expira o prazo das
ações previstas nos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODMs).
Para a ex-ministra do Meio Ambiente, Marina
Silva, o draft zero é um documento insuficiente porque não se aprofunda nas
questões do tratamento da desigualdade social. “Quanto à governança, não se
debruça em alternativas na área ambiental equivalentes ao papel da Organização
Mundial do Comércio (OMC), nesse segmento”. Em sua opinião, a Cúpula dos Povos
terá um papel importante de atuar “pelas bordas” do processo oficial. “É uma
parte que está se deslocando do núcleo do poder pelo poder. Vimos o exemplo dos
estudantes no Chile, dos jovens na Espanha, nos EUA e no Brasil, por exemplo,
contra a corrupção. É uma sustentação para as utopias.”
O teólogo e pensador Leonardo Boff considera
que a redação do documento do jeito que está não leva a nenhuma conclusão. “Não
enfrenta ou assume a crítica ao modelo vigente. Esse conteúdo já nasceu velho,
do século XIX, atendendo interesses das corporações.
De acordo com Oded Grajew, criador e membro
do Comitê organizador do Fórum Social Mundial (FSM), mesmo que acordos durante
a Rio+20 sejam difíceis de ser cumpridos, por dependerem de consensos, é
possível que haja um papel importante da sociedade civil. “Temos condições de
levar ao Rio de Janeiro referências que possam servir de exemplo a outros
países.”
Reflexões
sobre movimentos e governança global
Durante a assembleia internacional dos movimentos
sociais, João Pedro Stédile, do Movimento dos Sem-Terra (MST), que integra a
organização do Fórum, traçou o panorama e os desafios diagnosticados pelo FST
2012. “Ainda não conseguimos tirar as massas da apatia. Os que se destacam
ainda são parcela da juventude, desvinculada da produção... Temos de ser mais
criativos nas formas de organização e luta para envolver as massas. Sem isso,
não haverá força para enfrentar o poder do capital.”
“Bancos e mais de 500 empresas internacionais
controlam o mundo hoje. Essa situação está apenas começando e causará muitas
alterações na vida dos povos.” Segundo ele, nesse contexto, o centro de poder
econômico nos EUA estaria tomando medida para sair da crise, com a emissão sem
controle do dólar. “Com isso, pensam transferir o peso da crise a quem usar a
moeda. Ainda estimulam guerras locais. Não podem estimular guerra mundial,
porque há sete países que detêm a bomba atômica.”
Stédile teceu mais críticas ao modelo de
poder de acumulação norte-americano, que, em sua opinião, também se repete no
Brasil. “Recolhe-se no orçamento, para que grande parte seja destinada ao
pagamento de juros aos bancos. E mesmo com essas medidas, não estão conseguindo
sair da crise”, avaliou.
Segundo ele, o capitalismo enfrenta os seus
próprios desafios e o aumento das contradições. “Existe a dicotomia entre poder
econômico e político, diferentemente do período da Segunda Guerra Mundial. A
Rio + 20 será um teatro. Poderá trazer os chefes de Estado, mas não trará o
capital. Os bancos mudam os presidentes. Os governos não têm poder político
para controlar a crise. Como vai ser resolvida a contradição?”
Reivindicações
da sociedade
Uma das principais pautas na Cúpula dos Povos
é a da promoção da visibilidade aos povos tradicionais. Ronaldo dos Santos, da
Coordenação Nacional de Articulação Quilombola (Conaq), lembrou que atualmente
existem mais de cinco mil quilombos no país e muitos em condição de extrema
dificuldade. Segundo ele, o Brasil só pode conquistar posicionamento de
liderança internacional se tiver políticas e ações em benefício do povo.
Sônia Guajajara, vice-coordenadora da
Coordenação de Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), informou
que os povos indígenas irão fazer uma discussão política sobre a questão dos
territórios, dos impactos dos grandes empreendimentos em terras indígenas e da
necessidade do cumprimento da Convenção 169 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), que trata de direitos indígenas. “Vamos desenvolver nosso
posicionamento sobre economia verde, lembrando que nós já mantemos práticas
naturais não-destrutivas, com coleta e extrativismo.”
Para a Via Campesina, as bandeiras de luta
são em defesa da agroecologia e se somam aos indígenas e aos quilombolas, na
reivindicação do respeito aos povos tradicionais. Luiz Gonzaga da Silva –
conhecido por Gegê –, da Central de Movimentos Populares, reforçou a questão
das lutas urbanas estarem na pauta do encontro. A luta contra a mercantilização
ou privatização da natureza e dos chamados serviços ambientais é mais um tema a
ser tratado pelos movimentos sociais, de acordo com o ambientalista boliviano,
Pablo Solon.
Andrea Cristianne da Silva Mendes,
representante do Fórum Brasileiro e da Rede Intercontinental de Economia Social
e Solidária, afirmou que o movimento se preocupa com a integridade física dos
trabalhadores e que a economia solidária não pode ser confundida com economia
verde. “Na EcoSol, trabalhamos por outra ordem de consumo, pela agroecologia e
pela soberania da segurança alimentar, que convergem com as metas de
sustentabilidade.” Para a chilena Mafalda Galdames, da Marcha Mundial de
Mulheres, é momento de renovar compromissos pela soberania alimentar, de
defender a água como bem alienável.
Para saber mais a respeito da Cúpula dos
Povos, o site é: http://www.cupuladospovos.org.br e Rio+20 oficial (em português): www.rio20.info/2012
Sucena
Shkrada Resk – Fevereiro de 2012
IN “Revista Forum” – http://www.revistaforum.com.br/conteudo/detalhe_materia.php?codMateria=9403/Mobiliza%C3%A7%C3%A3o%20pelo%20meio%20ambiente
Nota do Comitê
Brasil sobre o Código Florestal
Comitê Brasil em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento
Sustentável
O Comitê Brasil em
Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável manifesta sua profunda
indignação com a aprovação do projeto de
Código Florestal pela Câmara dos Deputados em 25 de abril. A aprovação do
relatório do deputado Paulo Piau representa o maior retrocesso na legislação
ambiental na história do País.
Se o texto aprovado pelo
Senado já significava anistia aos desmatamentos ilegais e incentivos a novos
desmatamentos, os deputados conseguiram o que parecia impossível: torná-lo
ainda pior. O texto revisado pela Câmara dos Deputados, além de ferir os
princípios constitucionais da isonomia, da função social da propriedade e da
proibição de retrocessos em matéria de direitos fundamentais, fere frontalmente
o interesse nacional.
Usando hipocritamente o
discurso de defesa dos pequenos proprietários, os deputados derrubaram as
poucas melhorias que o Senado efetuou e aprovaram um texto que apresenta incentivos
reais a novos desmatamentos, inclusive em nascentes e outras áreas de produção
de água, ocupações em manguezais
(apicuns), e permite benefícios econômicos
mesmo para quem continuar a desmatar ilegalmente.
Considerando a
inconstitucionalidade do projeto e a contrariedade ao interesse nacional, que
trazem perversos impactos na vida de todos brasileiros, confiamos e apoiamos o compromisso
da presidenta Dilma de não aceitar anistia a crimes ambientais, redução de área
de preservação permanente e incentivos aos desmatamentos, o que só ocorrerá
com o Veto Total ao projeto aprovado na
Câmara.
Comitê
Brasil em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável – Brasília, 26 de abril
de 2012.