permite aumentar a participação política de setores hoje mal
representados, possibilitando que se tornem competitivos candidatos que hoje
não têm acesso a recursos. A redução da influência do poder econômico permite
assim aumentar a representatividade do sistema político.
O financiamento público gerará assim campanhas mais baratas, com um
teto de gastos estabelecido e fiscalizável. O aumento da transparência e da
possibilidade de controle dos gastos são evidentes.
Henrique Fontana
Vivemos um momento da sociedade brasileira em que a democracia está cada
vez mais forte. Podemos dizer com orgulho que uma sociedade que saiu da
ditadura militar há poucas décadas tem conseguido trazer os conflitos de
interesse para a arena institucional, ampliando a capacidade de representação,
incluindo cada vez mais setores historicamente alijados do poder. Encontrar os
caminhos para fortalecer e legitimar a política no Brasil é fundamental para
que continuemos este processo.
A política brasileira tem sido com muita frequência associada a casos de
corrupção. O canal eleitoral, sem o qual a maioria da população dificilmente
consegue fazer valer seus interesses, parece sob constante suspeita de servir
mais para promover compromissos obscuros do que o interesse público. Parece-nos
que encontrar formas de diminuir a possibilidade de relações escusas entre
interesses privados e representantes políticos é dar um passo seguro no
fortalecimento dos canais de representação. Por isto, estamos propondo que a
Comissão de Reforma Política enfrente o problema de mudar a legislação sobre o
financiamento das campanhas eleitorais.
É fato conhecido, por qualquer pessoa que tenha dedicado algum tempo a
analisar as campanhas eleitorais, no mundo inteiro, que os problemas de financiamento
são generalizados e observados em praticamente todos os países. As empresas e
grandes corporações sempre procuram os meios de influir na política, e é no
financiamento das campanhas que encontram o calcanhar de Aquiles dos políticos.
Nas últimas décadas, os problemas parecem ter se agravado. Houve uma clara
escalada dos gastos de campanha – da década de 1970 para cá, os aumentos foram
gigantescos. Veja os números recentes da campanha para deputado federal em todo
o Brasil: em 2002, foram gastos R$ 191 milhões; em 2006, foram R$ 439 milhões;
e em 2010 os custos pularam para R$ 926 milhões. Se essa escalada continuar,
onde chegaremos em 4 ou 8 anos?
E os dados mostram, ainda, que o volume de gastos nas campanhas é
decisivo para a capacidade de obter sucesso e se eleger: dentre os 513 eleitos
em 2010 para a Câmara, por exemplo, 369 estão entre os candidatos que mais
gastaram, segundo as prestações de conta ao TSE. Os eleitos gastaram em média
doze vezes mais do que o restante dos candidatos.
É claro que é possível fazer campanhas no sistema atual de maneira digna
e honrada, mas o financiamento privado, especialmente quando feito por
empresas, mesmo de forma transparente e legal, mantém sempre acesa a chama da
suspeita de que a fatura será cobrada e os interesses privados se sobreporão ao
interesse público. Esta situação repercute também para o lado das empresas,
cada vez mais resistentes a se expor a este tipo de ilações.
Financiar as campanhas eleitorais com os recursos públicos nos parece ser
a melhor maneira de enfrentar este quadro.
Em primeiro lugar, porque possibilita um financiamento livre de
interesses outros que não sejam os legítimos interesses de representação
política. Pela nossa proposta, o financiamento pelo Estado será definido por
critérios claros e transparentes, vinculados à força dos partidos junto à
sociedade.
Em segundo lugar, porque permite aumentar a participação política de
setores hoje mal representados, possibilitando que se tornem competitivos
candidatos que hoje não têm acesso a recursos. A redução da influência do poder
econômico permite assim aumentar a representatividade do sistema político.
Dentre as objeções mais comuns que temos ouvido sobre o financiamento
público encontra-se a de que o sistema não impede a burla, e que o caixa 2 e as
fraudes continuarão. As ilegalidades se apresentam em todas as atividades
reguladas por lei, por isso o projeto prevê a criminalização pelo desvio de
recursos e arrecadação ilícita (caixa 2), além de outras sanções eleitorais e
administrativas.
Os recursos seriam definidos pela Justiça Eleitoral, responsável também
pela gestão do futuro fundo para financiamento das campanhas, e distribuídos
aos comitês financeiros das candidaturas, de forma qu,e desde o início da
campanha, qualquer eleitor possa saber quanto e como estão sendo gastos os
recursos. O financiamento público gerará assim campanhas mais baratas, com um
teto de gastos estabelecido e fiscalizável. O aumento da transparência e da
possibilidade de controle dos gastos são evidentes.
A outra objeção frequente é quanto à fonte dos recursos: não seria
correto onerar os cofres públicos, desviando recursos de outras frentes, onde
seriam mais importantes. A pergunta crucial a fazer, contudo, seria: quantos
recursos públicos serão poupados pela ausência dos compromissos espúrios que o
atual sistema propicia (as emendas orçamentárias favorecendo gastos
desnecessários, os favorecimentos em licitações, os superfaturamentos)? Além
disso, em muitos casos há suspeitas de que as empresas embutem os gastos com
financiamento eleitoral nos seus preços, o que também acabaria sendo pago pelo
contribuinte. O investimento público nas campanhas certamente será compensado
pela economia na outra ponta.
Não pretendemos com este projeto criar um sistema perfeito e
invulnerável, mas dar passos seguros para que tenhamos campanhas mais baratas,
mais representativas, mais transparentes e, sobretudo, mais legítimas. O
fortalecimento da democracia merece este investimento.
Henrique Fontana – Deputado federal relator da Comissão Especial de Reforma Política da Câmara dos Deputados e do Partido dos Trabalhadores (PT) – 22.09.2011
IN “Caros Amigos” – http://carosamigos.terra.com.br/index2/index.php/correio-caros-amigos/1987-financiamento-publico-fortalece-a-democracia-e-democratiza-a-politica