o Banco, além do papel
anticíclico fundamental na crise de 2008, passou a protagonizar iniciativas de
incentivo à inovação, ao desenvolvimento tecnológico e a setores estratégicos.
Karen Fernandez Costa
As instituições políticas e a mediação por elas realizada entre as
tendências da economia internacional e o cenário político-econômico doméstico
constituem aspecto fundamental para a compreensão das potencialidades, desafios
e impasses da trajetória de desenvolvimento dos países. No caso brasileiro,
algumas instituições cumprem papel notável neste processo. Destaca-se no país o
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), instituição que,
em 2011, concedeu R$ 139,7 bilhões em empréstimos e que neste ano chegou ao seu
sexagésimo aniversário.
Fundado em 1952, a criação do BNDES ocorreu num contexto em que a
tendência era fundar bancos de desenvolvimento para viabilizar a
industrialização dos países periféricos. No entanto, ele se diferenciou por, ao
contrário das instituições análogas, ter resistido às mudanças no contexto
internacional e nacional, especialmente às reformas liberalizantes.
Em seu nascimento, a função do BNDE (à época sem o S, de Social) era a
de realizar um programa de reaparelhamento e fomento das atividades de
infraestrutura do país e de promover o desenvolvimento econômico. No governo
JK, o BNDES foi o grande agente financeiro e o órgão chave do Plano de Metas,
além de ter antecipado muitas das medidas que compuseram este plano. No
pós-1964, foi reconhecido como principal instrumento de execução da política de
investimento do Governo Federal e direcionou-se, já em 1968, para o setor
privado nacional. No II PND, quando o Governo Geisel pretendeu intensificar o
programa de substituição de importações e a empresa privada nacional passa a
ser vista como prioritária pelo governo, o BNDES promovia a industrialização
pesada e concebia a empresa privada nacional como foco de sua atuação.
Na década de 1980, quando estouraram no Brasil a crise da dívida e o
problema da inflação, o BNDES viveu momentos de ausência de orientação política
na concessão de financiamentos. No entanto, o Banco formulou uma estratégia (a
Integração Competitiva) independente do Governo Federal, antecipando muitas
medidas que posteriormente compuseram os Planos de Governo de Fernando Collor e
Fernando Henrique Cardoso.
A Integração Competitiva tinha como pressupostos: a abertura da
economia, com o objetivo de estimular a competitividade, o fim da proteção
tecnológica, da reserva de mercado e da diferenciação entre capital nacional e
capital estrangeiro; as privatizações, para melhorar a eficiência e liberar
recursos para outros setores e a competitividade dos serviços. Havia, por trás
desta plataforma, uma estratégia de desenvolvimento de médio e longo prazo.
Não foi esta a linha implementada nos governos Collor e Itamar e no
primeiro mandato de FHC. Nesse último período, a instituição foi pouco capaz de
pautar a agenda governamental, agiu de forma compensatória à política
macroeconômica e não buscou viabilizar ou redefinir uma estratégia de
desenvolvimento de médio e longo prazo.
Na segunda gestão de FHC, o BNDES instituiu fundos para incentivar
pequenas empresas de base tecnológica, mas as iniciativas foram limitadas tanto
do ponto de vista dos recursos despendidos como da importância e visibilidade
que obtiveram no interior e fora da instituição. Nos anos 1990, o banco foi
incapaz de impulsionar, junto a outros atores relevantes como, por exemplo, o
Ministério do Planejamento e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio, a priorização de temas relacionados à política industrial e aos
investimentos em infraestrutura na agenda governamental. De modo geral, agiu a
reboque das prioridades da Fazenda/Banco Central e foi “estratégico” para
viabilizar o que era emergencial ao governo (o ajuste fiscal, por exemplo).
A partir de 2003 e, especialmente da gestão de Luciano Coutinho no
BNDES, foram retomados aspectos que permaneciam na sua agenda interna. Foi
recuperada a perspectiva de formular e implementar políticas de desenvolvimento
e foram elaborados planos de política industrial (Política Industrial,
Tecnológica e de Comércio Exterior – PITCE e a Política de Desenvolvimento
Produtivo) que traziam a perspectiva de se investir em setores estratégicos e
de priorizar a inovação. Assim, o Banco, além do papel anticíclico fundamental
na crise de 2008, passou a protagonizar iniciativas de incentivo à inovação, ao
desenvolvimento tecnológico e a setores estratégicos.
A trajetória do BNDES permite a elucidação de aspectos fundamentais do
percurso do desenvolvimento brasileiro e mostra que ele continuará a ser peça
chave nos rumos do país.
Karen
Fernandez Costa – Doutora em Ciência Política pela Unicamp,
pesquisadora do INCT-Ineu e professora da Escola Paulista de Política, Economia
e Negócios (EPPEN) da Unifesp – Janeiro de 2013.
IN Revista Desafios do Desenvolvimento – http://desafios.ipea.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2877:catid=28&Itemid=23