a reação brasileira se dá em momento
favorável ao fortalecimento ao menos parcial de objetivos de longo prazo:
multilateralismo, respeito às regras da convivência internacional.
Tullo Vigevani
A crise na
relação entre Brasil e EUA não é um raio em céu azul. Resulta de condições
nacionais e internacionais propícias a fortes questionamentos da política
americana. É certo que a espionagem de governos e territórios estrangeiros é
milenar. Há episódios na mitologia grega, há fatos citados na Bíblia. Isso não
elimina a obrigação de, quando descoberta, ser vigorosamente denunciada e
combatida.
No Brasil, a
decisão de reagir de modo forte à espionagem conta com apoio quase unânime,
ainda que com diferenças de tons. Portanto, o que parece ser uma decisão tomada
a partir da vontade da presidente Dilma Rousseff tem como subproduto seu
fortalecimento popular e mesmo entre as elites. Isso tem diferentes motivos,
lembremos a tradição brasileira de prezar o direito internacional, a autonomia,
a soberania.
No plano
internacional, essa tensão se entrelaça com o forte questionamento da política
do governo Obama na Síria. Como acabamos de ver na ONU e no G20, a posição
daquele governo é bastante isolada. Além de perder apoios históricos, da
Grã-Bretanha e da Alemanha, sua força no Congresso é duvidosa e boa parte da
população americana rejeita a intervenção.
Consequentemente,
a reação brasileira se dá em momento favorável ao fortalecimento ao menos
parcial de objetivos de longo prazo: multilateralismo, respeito às regras da
convivência internacional. A crise e as consequentes exigências brasileiras se
inserem nessa trajetória.
Os EUA são
ainda o país mais importante na ordem mundial. Interessam ao Brasil boas
relações, fortalecimento do comércio, cooperação em geral. Para isso, ainda que
essa crise seja de algum modo superada, é importante deixar claro que soberania
e autonomia não podem ser barganhadas e que os tempos do unilateralismo vão se
encurtando. Nessa perspectiva se insere a projetada viagem da presidente aos
EUA.
Tullo Vigevani – Professor da UNESP, membro do Instituto Nacional
de Ciência, Tecnologia de Estudos dos EUA e do Grupo de Reflexão sobre Relações
Internacionais – 09.09.2013
IN
Blog Brasil no Mundo – http://blogbrasilnomundo.wordpress.com/2013/09/09/os-tempos-do-unilateralismo-vao-se-encurtando/#more-563
Em resposta a espionagem americana, Dilma defenderá
na ONU internet livre
da rede e governança multissetorial da
rede mundial estarão entre os temas defendidos pela presidenta em seu discurso
na abertura da assembleia geral das Nações Unidas na próxima semana.
Redação Rede Brasil Atual
São Paulo –
A defesa de uma internet livre será um dos destaques do discurso da presidenta
Dilma Rousseff na abertura da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, na próxima
semana. Será mais uma demonstração da importância que o tema ganhou na agenda
do Planalto após as denúncias de que o esquema de espionagem da NSA, agência de
segurança da Casa Branca, rastreou comunicações pessoais de Dilma.
Esse foi um
dos pontos mais abordados pela presidenta durante a reunião que realizou na
segunda-feira (16) com membros do Comitê Gestor da Internet (CGI), entidade de
governança da internet brasileira que reúne representantes de governo, setor
empresarial, sociedade organizada e da comunidade acadêmica.
Ainda antes
do encontro, Dilma afirmou a jornalistas que iria abordar em seu discurso a
espionagem norte-americana, que a levou a cancelar a visita que faria a Barack
Obama em outubro. Em entrevista concedida na sala VIP do Aeroporto Salgado
Filho, em Porto Alegre, Dilma destacou que seu discurso vai salientar a
necessidade de se manter a neutralidade da rede mundial de computadores e a
proibição de usar a internet para ações de espionagem. Segundo ela, o
presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, já foi informado do teor do
discurso.
De acordo
com Veridiana Alimonti, uma das representantes da sociedade civil no CGI, Dilma
se mostrou muito interessada nos detalhes do modelo apresentado e nas discussões
sobre governança internacional da internet que ocorrem em diversos fóruns.
“Ressaltamos a importância de uma governança da internet que contemple todos os
setores e que leve em conta a experiência que o CGI já tem aqui no Brasil há
tanto tempo. Também há a necessidade de que a internet seja regida por
princípios, como o próprio decálogo que o CGI aprovou, em 2009, que chegou a
inspirar o Marco Civil da Internet”, relata a conselheira.
Veridiana
destacou que já existe uma discussão para o estabelecimento de uma governança
multissetorial em nível internacional para a internet, iniciada na Cúpula
Mundial sobre a Sociedade de Informação da ONU. “Tem um processo que acontece
em fóruns organizados dentro do sistema ONU de pensar uma governança da internet
multissetorial e que também seja mais equilibrada entre os países”, explica.
Apoio à neutralidade da rede
O governo
brasileiro também trabalha para desenvolver o tema internamente, como demonstra
o pedido de urgência na tramitação do projeto de lei que cria o marco civil da
internet, emitido pelo Planalto na semana passada. A própria reunião com o CGI,
que contou com a presença de sete ministros, foi uma demonstração da virada na
pauta.
“Nós não
tínhamos, até então, tido uma reunião com a presidenta no governo Dilma”, conta
Veridiana. “Essa movimentação, em si, já foi muito importante para que nós
pudéssemos apresentar algumas questões sob a nossa perspectiva. Isso mostra que
o governo está tratando as diversas questões com relação à internet como
prioridade, e é claro que tem relação com os recentes acontecimentos.”
Segundo a
conselheira, a presidenta afirmou que o governo está disposto a defender a
neutralidade da rede, mas destacou a importância de ter o apoio do CGI, porque
há desafios pela frente, como a possibilidade de emendas que alterem o texto a
pedido das empresas de telecomunicações.
Os
conselheiros criticaram o parágrafo segundo do artigo 15 do Marco Civil, que
cria uma exceção para que as violações de direitos autorais sejam retiradas do
ar sem necessidade de decisão judicial. “No momento em que falamos que o artigo
estimulava a retirada de conteúdo sem ordem judicial, ela não gostou muito”,
relata Veridiana.
Os membros
do CGI defenderam que o tema não seja tratado no marco civil, que já define que
sejam seguidas legislações em contrário. “No caso de responsabilidade de
conteúdos por terceiros, não é só direitos autorais que é uma questão. Tem
outros casos de legislações específicas com relação a racismo, crime contra a
honra etc.”
Outra
preocupação manifestada foi em relação à proposta de incluir no marco civil a
obrigatoriedade de armazenamento de dados em servidores localizados no
território brasileiro. “Existe alguma controvérsia em relação a isso, primeiro
porque, em termos de espionagem, isso não é muito efetivo porque há outras
formas de se capturar dados. Pelo próprio tráfego dos pacotes na rede as
empresas de telecomunicações conseguem fazer isso. Ou se os dados estiverem
armazenados aqui e espelhados fora as empresas também conseguem”, explica.
Além disso,
há preocupação a respeito da lei brasileira, que não é clara em relação à
privacidade dos usuários. “Você estaria guardando os dados aqui, só que nós não
temos muitos parâmetros definidos para a proteção de dados pessoais. Nesse
sentido, nós colocamos na reunião que seria mais interessante que essa
discussão do armazenamento de dados não fosse feita no marco civil, mas em um
outro projeto de lei que ainda está no governo, que é o anteprojeto de lei de
proteção de dados pessoais. Nele, ela poderia ser feita com mais cuidado, com
questões mais técnicas, e também porque viria, junto com ele, um regime de
proteção de dados”, defende Veridiana.
Redação Rede Brasil Atual – 18.09.2013