Portanto, as corporações já não estão sujeitas a limitações em suas
doações para as campanhas eleitorais. (...)
É democrática a proporção entre a liberdade de palavra de 26
multimilionários e de 50 milhões de cidadãos “normais”?
Roberto Savio
Não
passa uma semana sem que surja um escândalo relacionado com os bancos. O último
foi o do banco britânico Standard Chartered, acusado pelo departamento de
finanças do Estado de Nova York de lavagem de US$ 250 bilhões para potencial
apoio a atividades terroristas.
Até
agora, o Standard Chartered era considerado um dos bancos mais limpos, mas no
dia 14 deste mês concordou em pagar uma gigantesca multa de US$ 340 milhões
para frear a ação judicial.
Estamos
agora entrando em outro nível da série incessante de escândalos bancários, já
que começa a afetar diretamente alguns dos mais poderosos financistas do mundo,
não apenas seus próprios bancos.
O
ex-ministro da Economia da Espanha e ex-diretor gerente do Fundo Monetário
Internacional, Rodrigo Rato, foi responsabilizado pela desestabilização do
sistema bancário espanhol, foi inquirido em uma audiência parlamentar e se
sucedem os apelos públicos para seu julgamento.
E,
algo impensável até há pouco, o escritório do defensor do Povo Europeu
(ombudsman) anunciou que iniciará uma investigação sobre a afiliação do
presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, ao chamado Grupo dos
30, por ser “incompatível com a independência, reputação e integridade do BCE”.
Draghi
foi vice-presidente do Goldman Sachs, o maior banco de investimentos do mundo,
e o Grupo dos 30 (organização privada de altos funcionários, financistas,
executivos de corporações e acadêmicos) é acusado de reunir personalidades
influentes para orientar decisões nas áreas de economia, finanças e política
internacionais.
Acusações
semelhantes foram feitas durante anos contra a Comissão Trilateral, o Grupo
Bilderberg e o Fórum Econômico Mundial. A diferença é que o Grupo dos 30
ocupa-se especificamente de finanças.
Por
sua vez, a organização não governamental Corporate Europe Observatory, aponta o
caso de outro executivo do Goldman Sachs: Mario Monti, primeiro-ministro da
Itália, conselheiro internacional desse banco de investimentos entre 2005 e
2011.
Que
tudo isto tenha algum resultado, é muito duvidoso. Os laços entre finanças,
corporações e política são tão estreitos que apenas uma verdadeira revolução
poderia desfazê-los.
O
exemplo mais patente do caminho que está sendo seguido vemos nos Estados
Unidos, onde o custo da campanha presidencial provavelmente superará a
assombrosa quantia de US$ 2 bilhões. Isto se deve em grande parte à decisão de
2010 da Suprema Corte, que estendeu o direito à liberdade de expressão das
pessoas às empresas.
Portanto,
as corporações já não estão sujeitas a limitações em suas doações para as
campanhas eleitorais.
O
dinheiro procedente de doações secretas aumentou de 1%, em 2006, para 44%, em
2010. Este ano, 26 multimilionários doaram US$ 61 milhões aos Comitês de Ação
Política. O valor do patrimônio desses 26 magnatas é igual ao valor conjunto da
renda média de 50 milhões de norte-americanos.
É
democrática a proporção entre a liberdade de palavra de 26 multimilionários e de
50 milhões de cidadãos “normais”?
Está
bastante claro que o candidato republicano Mitt Romney, que junto com seu
companheiro de chapa, Paul Ryan, ocupa a direita do cenário político
norte-americano, dispõe de mais fundos para sua campanha do que seu adversário,
o presidente Barack Obama, graças às contribuições das corporações e em
especial dos bancos.
Aparentemente,
algumas pessoas começam a se dar conta da gravidade da situação e de sua
insustentabilidade.
Causou
grande surpresa Sanford Weill (banqueiro, financista e filantropo norte-americano)
declarar publicamente que “o que provavelmente deveríamos fazer seria separa os
bancos de investimento dos bancos de depósito. Os bancos não devem fazer
operações que coloquem em risco o dinheiro dos contribuintes, nem deve haver
bancos que sejam grandes demais para quebrar”.
Weill,
ex-presidente do Citrigroup, manteve durante anos em seu escritório uma placa
onde se lia “O destruidor de Glass-Steagall”. A lei Glass-Steagall, aprovada
pelo parlamento norte-americano em 1933 após a grande Depressão de 1929,
estabeleceu uma rígida separação entre os bancos de depósito (comerciais) e os
bancos de investimentos.
Dessa
forma se protegeu o dinheiro dos clientes dos bancos comerciais, já que a lei
determinava que não podia voltar a ser utilizado para atividades especulativas,
que ficaram reservadas para os bancos de investimentos, por sua conta e risco.
A lei
Glass-Steagall foi revogada pelo presidente Bill Clinton em 1999 para agradar
Wall Street.
Desde
então, John S. Reed, o cofundador do Citigroup, pediu perdão por ter criado
este gigante devastador que, para impedir sua quebra, teve que ser socorrido
por milhares de milhões de dólares de empréstimos governamentais, isto é,
dinheiro dos contribuintes.
Outros
dois ex-diretores executivos de bancos de investimentos, Philip Purcell, do
Morgan Stanley, e David Romansky, do Merrill Lynch, que tiveram papéis de
destaque na revogação da lei Glass-Steagall, expressaram semelhante
arrependimento.
É uma
pena que Weill e seus amigos já não estejam no poder.
Até
uma módica medida, com um imposto simbólico sobre as transações financeiras,
chamada Taxa Tobin, é rechaçada pelo mundo das finanças, embora tenha o apoio
de personalidades tão respeitáveis como a chanceler alemã, Angela Merkel. o
ex-presidente francês, Nicolas Sarkozy, e seu sucessor, François Hollande.
Roberto Savio – Fundador e presidente emérito da agência de
notícias IPS (Inter Press Service) e editor do Other News – 28.08.2012
IN “Envolverde/IPS” – http://envolverde.com.br/economia/escandalos-bancarios-uma-historia-de-nunca-acabar/
IN “Envolverde/IPS” – http://envolverde.com.br/economia/escandalos-bancarios-uma-historia-de-nunca-acabar/