sábado, 9 de agosto de 2014

A conjuntura é de mudança

 

ao menor sinal de crise, a agenda de reformas é compelida à primeira estratégia de combate. Assim o fizeram todos os presidentes depois da democratização. Com o apelo de uma sociedade civil que reclama do desempenho ruim de políticas públicas essenciais, tais como saúde e segurança, e da forte corrupção praticada por políticos e burocratas, a agenda de reformas se tornou constante, obrigando uma permanente renegociação das regras do jogo político. A reforma política, em particular, é sempre acionada como solução para todos os problemas, colocando os agentes do pacto na corda bamba, buscando equilibrar a incerteza das mudanças com o equilíbrio do status quo.



Fernando Filgueiras

No dia 31 de janeiro publicamos um artigo nessa mesma coluna sobre financiamento de campanhas eleitorais no Brasil. Naquele texto usamos a metáfora do cachorro correndo atrás do próprio rabo na tentativa de explicar os dilemas de mudanças nas regras de financiamento eleitoral. De fato o é. A incansável busca por probidade no processo de representação política e na gestão pública coloca a agenda de reformas como uma constante em toda a trajetória política do Brasil depois de 1988.

No Brasil, a transição para a democracia foi operada por meio de um pacto negociado e permanentemente renegociado entre as elites políticas. O pacto é o acordo explícito que define as regras do jogo político, as quais orientam o comportamento dos agentes e estabelece as garantias mútuas para os participantes. No cenário da transição democrática, esse pacto - não democrático em essência - levou o Brasil rumo à democracia. Aparentemente contraditório, esse cenário de transição assegurou estabilidade por meio de mudanças políticas e institucionais firmes, balizadas na ação das elites políticas.

Submetida a esse controle das elites políticas, a estabilidade foi assegurada não só pelas regras do jogo, mas também pela diminuta possibilidade, àquela época, de revolta popular e violência política. Esta violência foi confinada a espaços restritos, onde a desigualdade se faz mais presente e iníqua. O fato é que a democracia brasileira guarda, em suas origens, fortes elementos oligárquicos.

Reformas nos farão correr atrás do próprio rabo de novo.

(...)


Fernando Filgueiras - Professor de Ciência Política da UFMG, coordenador do Centro de Referência do Interesse Público (Crip) – 19.02.2014
IN Valor Econômico, ed. impressa.