quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O preço das alianças


AVRITZER - "Neste presidencialismo de coalizão fragmentado, fazer alianças é bom e ruim. É bom porque é difícil governar sem maioria no Congresso. Mas o preço dessa maioria é ruim para o país. Sabemos quais são os partidos ligados às falhas nas obras de infraestrutura para a Copa, por exemplo. Não é bom ter alianças tão amplas, mas elas garantem tempo na TV e uma certa governabilidade. É infeliz a frase de Aécio. O "sugar" não diz respeito ao governo, é sugar o país. O preço das alianças amplas é a ineficiência da máquina pública. Se for eleito, é Aécio quem vai ter que lidar com esse problema. Uma das grandes dificuldades do país é um centro apolítico fisiológico representado por alguns partidos".

Diego Viana
No contexto de uma eleição marcada pela insatisfação popular com a representação política, um dos fenômenos políticos mais importantes é a ascensão do Partido Socialista Brasileiro (PSB) ao ponto de se qualificar, em princípio, para disputar uma vaga no segundo turno e alterar a correlação de forças políticas no Brasil. É a opinião do cientista político Leonardo Avritzer, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e presidente da Associação Brasileira de Ciência Política.
Para Avritzer, a presença da aliança entre Eduardo Campos (PSB) e Marina Silva no pleito soma-se a outros fatores significativos para os resultados da eleição de outubro, como o desgaste dos 12 anos de governo petista, que começa a desfazer a ampla aliança da eleição de 2010, e o desafio que o candidato tucano, o senador mineiro Aécio Neves, enfrenta para nacionalizar uma liderança ainda estadual.
Ao fim de um período em que um possível fracasso da organização da Copa do Mundo, incluídas as obras de infraestrutura, era um assunto de temores públicos e debates políticos, a conclusão do torneio abre as portas para o período eleitoral. Embora a questão da Copa tenha sido politizada tanto pelo governo quanto pela oposição, Avritzer entende que ambos erraram, ao não perceber que o tema dizia respeito a um compromisso não do governo, mas do país.
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Diego Viana – 04.07.2014
Leonardo Avritzer – Cientista Político professor titular da UFMG 
In Valor Econômico, edição impressa.





Sugadores para todos

Trata-se de um aspecto estrutural do sistema político brasileiro. O presidencialismo de coalizão visa à formação de maiorias e não se constroem maiorias sem o recurso aos partidos de adesão. E os incentivos para a aproximação também estão presentes no processo eleitoral - num jogo que não pode ser desvinculado da dinâmica governativa. Governos oferecem prebendas, presentes e futuras, para manter ou atrair aliados de campanha. Mas há também o valioso tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV. Quem não o aufere, sabe que o aliado o arrebanhará, num jogo de soma zero - o que um perde é exatamente o que o outro ganha.

Cláudio Gonçalves Couto
Nos idos de março, o presidente do PMDB gaúcho, Edson Brum, proferiu a seguinte pérola da sinceridade política, crivada de ironia: "A única certeza que tenho é que o PMDB estará com o próximo presidente, ganhe Dilma, Aécio ou Campos. Por que me preocupar com isso agora?". Foi complementado nesta semana pelo presidenciável tucano, Aécio Neves, numa referência à adesão de PSD e PR à postulação da presidenta Dilma Rousseff, ao mesmo tempo que o PTB se mandava para as bandas de sua candidatura: "Muito mais gente já desembarcou e o governo ainda não percebeu. Vão sugar um pouco mais. E eu digo para eles: façam isso mesmo, suguem mais um pouquinho e depois venham para o nosso lado".
Ambas as declarações explicitam o modus operandi de nosso sistema partidário, tanto no âmbito eleitoral quanto na dimensão governativa. O PMDB é o exemplar maior de um tipo de agremiação - o partido de adesão - que aderirá a qualquer governo ou candidatura, sem maiores preocupações programáticas, desde que bem recompensado. São lábeis os limites para essa adesão pragmática tão flexível: de forma pontual, quando estiverem em jogo interesses específicos de setores sociais vinculados a determinados membros do partido (como seus financiadores de campanha e bases eleitorais), ou quando as mutantes circunstâncias da conjuntura política tornarem oportuno um rompimento justificado por questões de fundo puramente retóricas.
Afora tais circunstâncias, enquanto bem recompensados com cargos, verbas e apoios eleitorais localizados, os partidos de adesão se manterão jungidos a quem lhes favoreça. Porém, da mesma forma, saltarão do barco tão logo o custo do apoio se eleve ou haja recompensa maior por perto. Como não se prendem a nenhuma plataforma de envergadura, não lhes custa nada migrar de um governo para outro, mesmo que sejam liderados por agremiações - essas sim - dotadas de alguma consistência programática e de objetivos mais claros para as políticas públicas. Tais agremiações, por sua vez, não têm como simplesmente prescindir do apoio dos partidos de adesão, na ilusão de assim implementar suas agendas sem a necessidade de concessões e menores riscos de corrupção.
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Cláudio Gonçalves Couto – Cientista Político professor da FGV – 27.06.2014
IN Valor Econômico, edição impressa.