quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Sincronia e transformação


A sociedade brasileira está sentindo e vivendo o esgotamento completo dos seus dois grandes projetos tradicionais: o liberal e o desenvolvimentista. Por isso mesmo, soam tão velhas, vazias e inóquas as declarações propositivas do governo, tanto quanto as da oposição mais ilustrada. (...)
O Brasil está vivendo um momento e uma oportunidade única de se ‘reinventar’, redefinindo e repactuando seus grandes objetivos e a própria estratégia de construção do seu futuro e de sua inserção internacional, com os olhos postos no século xxI.

José Luís Fiori
José Serra: "Partamos nesse instante para uma ofensiva e não fiquemos na defensiva porque a defensiva será a vitória de fato dessas forças reacionárias que hoje investem contra o povo brasileiro". Pronunciamento ao vivo na Rádio Nacional do RJ, feito na madrugada do dia 1º de abril de 1964. 

Apesar de sua aparente instabilidade, a história política da América do Sul apresenta uma surpreendente regularidade, ou "sincronia pendular". Alguns atribuem ao acaso, outros à conspiração política e a grande maioria, aos ciclos e às crises econômicas. Mas na prática, tudo sempre começa em algum ponto do continente e depois se alastra com a velocidade de um rastilho de pólvora, provocando rupturas e mudanças similares nos seus principais países. Esta convergência já começou na hora da independência e das guerras de unificação dos Estados sul-americanos, mas assumiu uma forma cada vez mais nítida e "pendular", durante o século XX.
Foi assim que na década de 30 se repetiram e multiplicaram por todo o continente as crises e as rupturas de viés autoritário; da mesma forma que na década de 40, quase todo o continente optou simultaneamente pelo sistema democrático que durou até os anos 60 e 70, quando uma sequência de crises e golpes militares instalou os regimes ditatoriais que duraram até os anos 80, quando a América do Sul voltou a se redemocratizar. Mas agora de novo, na segunda década do século, multiplicam-se os sintomas de uma nova ruptura ou inflexão antidemocrática - a exemplo do Paraguai - com o afastamento parlamentar e/ou judicial do presidente eleito democraticamente.
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José Luís Fiori – Professor titular de economia política internacional da UFRJ – 28.09.2015
IN Valor Econômico, ed. Impressa (republicado em Carta Maior).