sábado, 12 de março de 2016

Conflito na elite e escândalos de corrupção


Meu objetivo não é negar a existência de corrupção hoje. E muito menos comparar com níveis anteriores. Mas argumentar que a corrupção não foi inaugurada nem monopolizada pelo governo do PT. E se se pretende alguma efetividade no combate à corrupção, é preciso não tratá-la como obra de um só partido ou governo, como parece saber o povo que resiste e m ir às ruas. Por isso, "decepar", por meio do impeachment, a cabeça do que chamou de "Estado-camarão", como defende o autor citado acima, não me parece a solução para o problema. As investigações atuais começam a se estender a membros de outros partidos e de outros governos. Substituir a presidenta pelo seu vice certamente diminuiria o conflito na elite política e, consequentemente, os escÂndalos, mas é muito pouco provável que diminua a corrupção. Diminuiria também a percepção de existência de corrupção. O que  poderia ser útil, mas certamente seria falso.

Argelina Cheibub Figueiredo
Em 1994, em sua conferência no Encontro Anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciência Sociais), o cientista político americano Theodore Lowi expôs sua teoria sobre escândalos de corrupção. Escândalos de corrupção, disse ele, decorrem de conflitos na elite política. Afirmou ainda que escândalos de corrupção não tÊm relação com níveis de corrupção. Ou seja, o tamanho do escândalo não tem nada a ver com o tamanho da corrupção, depende do grau de dissenso na elite. Será que essa teoria se aplicaria ao caso do Brasil recente? Vejamos.
Como bem lembrou o cientista político e consultor Bolívar Lamounier no artigo “Impeachment e reforma do Estado-camarão”, em “O Estado de S. Paulo”, de 31.01.2016, “em 1958, o jurista Raymundo Faoro colocou [o] tema [do patrimonialismo] na agenda intelectual brasileira ao abordá-lo no livro ‘Os donos do Poder’ – Formação do Patronato Político Brasileiro” (Ed. Globo, 1958). Mas entre colocá-lo na agenda intelectual e conseguir que o ‘patronato político’ referido no subtítulo da obra se decida a reformar ou a desmantelar de vez tal sistema, vai evidentemente uma grande distância’. Se o conceito não é de amplo conhecimento da população, o reconhecimento da existência de práticas patrimonialistas nos governos e no estado brasileiro faz parte do senso comum. E não é de hoje.
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Argelina Cheibub Figueiredo – Professora de Ciência Política no Iesp-Uerj – 15.02.2016.
IN Valor Econômico, ed. impressa.