Sim, o combate permanente à corrupção é um traço indispensável ao
Estado de Direito. Mas, justamente por isso, é preciso ter em mente que ele não
se presta a vitórias cabais, pois –embora possa sempre ser reduzida– a
corrupção não pode ser erradicada. (...)
Operações ambiciosas de limpeza abrupta tenderão antes a se mostrar
contraproducentes a longo prazo, pela fixação de precedentes talvez
insustentáveis, pela insegurança jurídica decorrente e, no limite, pela própria
desestabilização política eventualmente induzida. Pois é a vigilância mútua
produzida pela competição partidária, corrupta que seja, que ironicamente
constitui a base sobre a qual se assenta a cristalização institucional e a
consequente autonomização burocrática hoje exibidas pelas instituições de
controle.
Petistas vigiando tucanos e tucanos vigiando petistas constituem um
lastro político fundamental para as instituições de controle. Nossos bravos
procuradores, juízes e delegados, ao buscarem limpar o sistema, zerar o jogo,
inspirados pelo combate à máfia (de onde se importou a metodologia da delação
premiada), estão serrando o próprio galho político-institucional sobre o qual
se apoiam. E, em caso de desestabilização mais aguda da disputa política, é
quase certo que o sistema saia pior na outra ponta.
Bruno P. W. Reis
Depois de vivermos, entre 1995 e 2012, o período mais estável da história
política brasileira, com resultados econômicos e sociais relevantes para
exibir, iniciamos a campanha eleitoral deste ano num quadro francamente
preocupante.
Com a economia estagnada já há alguns anos e a elite política quase
inteiramente ameaçada por uma interminável investigação judicial publicamente
imbuída do propósito ingênuo de "passar o país a limpo", o Congresso
Nacional, sob a batuta de um inimigo do governo, derivou ao longo de 2015 (e
depois obstinou-se em 2016) rumo à consumação de um impeachment presidencial
profundamente contestado, que aguçou de maneira dramática uma polarização
política que já vinha se agravando lentamente desde 2006.
Neste momento, as perspectivas são de incerteza não só quanto à dinâmica
eleitoral no curto prazo mas também quanto ao vigor da eventual recuperação
econômica no futuro próximo, quanto à recomposição de alguma clivagem política
estável, quanto à capacidade do sistema partidário prosseguir como fiador
eleitoral e organizador do jogo parlamentar e, de maneira mais remota, até
mesmo quanto à própria sobrevivência da ordem constitucional vigente.
Como viemos parar aqui? A narrativa predominante parece apontar o dedo
para os vícios de uma elite política corrupta, propensa a uma relação
predatória com uma sociedade que, passiva, a sustenta com seus impostos, e,
desinformada, com seus votos.
(...)
Para continuar a leitura, acesse http://m.folha.uol.com.br/ilustrissima/2016/09/1813664-novas-regras-de-financiamento-e-uma-tipologia-de-nossos-politicos.shtml
Bruno P. W. Reis – Professor de ciência política na Universidade Federal de Minas Gerais - 18.09.2016.
IN Folha de São Paulo, Ilustríssima.