domingo, 2 de outubro de 2016

O que é um golpe de Estado?


O sujeito do golpe de estado moderno é, como Luttwak destacou, uma fração da burocracia estatal. O golpe de estado não é um golpe no Estado ou contra o Estado. Seu protagonista se encontra no interior do próprio Estado, podendo ser, inclusive, o próprio governante. Os meios são excepcionais, ou seja, não são característicos do funcionamento regular das instituições políticas. Tais meios se caracterizam pela excepcionalidade dos procedimentos e dos recursos mobilizados. O fim é a mudança institucional, uma alteração radical na distribuição de poder entre as instituições políticas, podendo ou não haver a troca dos governantes. Sinteticamente, golpe de estado é uma mudança institucional promovida sob a direção de uma fração do aparelho de Estado que utiliza para tal de  medidas e recursos excepcionais que não fazem parte das regras usuais do jogo político.


Álvaro Bianchi
Discute-se muito a respeito da possibilidade de um golpe de estado no Brasil. Mas a discussão não deveria ignorar a necessidade de uma rigorosa conceitualização, nem a vasta bibliografia existente sobre o tema. Já no século XVII Gabriel Naudè definia o coup d’état como “aquelas ações arrojadas e extraordinárias que os príncipes são forçados a tomar em situações difíceis e desesperadas, contrariamente à lei comum, sem manter qualquer forma de ordem ou justiça, colocando de lado o interesse particular em benefício do bem público” (NAUDÈ, 1679, p. 110).
Em Naudè o coup d’état se confunde com a própria raison d’état. Em sua exposição considerava, por exemplo, que a perseguição aos huguenotes na noite de São Bartolomeu decretada pelo rei Carlos IX havia sido um golpe de estado, assim como o assassinato do duque de Guise por Henrique III e a proibição pelo imperador Tibério de que sua cunhada se casasse novamente e tivesse filhos que disputassem o trono. O livro de Naudè já oferece uma pista para uma definição de golpe de estado: um conceito eficaz de golpe de estado deve levar em conta seu sujeito e os meios excepcionais que este utiliza para conquistar o poder.
A inspiração de Naudè era fortemente maquiaveliana. Sua obra não tinha por objeto apenas a conquista do poder. Ela trata, também, das condições necessárias para sua manutenção. Assim como o secretario florentino, Naudè ainda não fazia aquela distinção propriamente moderna entre o príncipe e o Estado. Dai que o coup d’état fosse sempre retratado como uma conspiração palaciana e seu protagonista fosse sempre o soberano. Tratava-se de uma era de transição. Escrevendo contemporaneamente a Naudè, Thomas Hobbes insistiria nessa identificação entre o soberano e a sociedade política, mas em autores imediatamente posteriores, como John Locke o governante e o Estado já aparecem como duas entidades separadas.
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Álvaro Bianchi – Cientista Político Professor do IFCH/Unicamp – 26.05.2016.
In Blog Junho.