Rogério Arantes – “Desde 1988 a Justiça não conheceu qualquer
derrota no seu enfrentamento com a Política. Pelo contrário, além de se
fortalecer cada vez mais, ela se beneficiou de um sistema político fragmentado
em que iniciativas políticas que significariam retrocessos no combate à
corrupção ou diminuição dos poderes do Judiciário não prosperaram. Veja, por
exemplo, a recém-frustrada tentativa de anistiar a prática do caixa dois nas
eleições. Mesmo que tivesse sido aprovada na madrugada da
Câmara, seguiria incólume no Senado? E mesmo sendo aprovada no Senado, deixaria
de ser questionada e muito provavelmente derrubada no STF, que hoje em dia
detém a última palavra sobre quase tudo de relevante que se passa no país? Pode
ser exagero dizer que vivemos sob o governo dos juízes, mas que seu
protagonismo deslocou o centro gravitacional da democracia brasileira é algo
que me parece bastante claro. Outro aspecto importante é que um dos
combustíveis da Justiça é o moralismo. É curioso como juntos eles podem causar
a alternância no poder, por vias eleitorais e não eleitorais como tem ocorrido
no Brasil atual, mas não podem tomar o lugar da Política por completo, que tem
sua lógica própria e que, pelo menos na Democracia, constitui a linguagem e o
espaço mais legítimos da representação e do governo. Seja como for, essa peleja
entre Justiça e Política está inscrita no nosso desenho institucional e deve
ser encarada como um campeonato permanente e não apenas como uma partida
isolada”.
André de Oliveira
Em tempos menos turbulentos, talvez os últimos cerca de dez dias que
passaram fossem classificados como um dos momentos mais agitados na vida
nacional do último ano. Teve posse da nova presidenta do Supremo Tribunal Federal (STF).
Teve o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha
(PMDB), cassado. E teve, por fim, o ex-presidente Lula sendo transformado em réu na Lava Jato depois
de uma denuncia controversa apresentada por parte de
procuradores. Professor da Universidade São Paulo (USP), o cientista
político Rogério Arantes tem estudado há anos o sistema Judiciário brasileiro
e, mais especificamente, a atuação do Ministério Público (MP) e da Polícia
Federal (PF). Em conversa por e-mail com o EL PAÍS comentou os principais
acontecimentos dos últimos dias.
Pergunta. A apresentação da denúncia contra o ex-presidente Lula e
a recente prisão do ex-ministro Guido Mantega foram
criticadas por uma série de analistas de diferentes espectros políticos. As
críticas têm razão?
Resposta. De fato, a denúncia contra Lula não trouxe nenhuma
novidade. Apenas a forma de apresentá-la é que surpreendeu. Mas um analista
atento da Lava Jato é capaz de perceber como desde o início ela está
estruturada numa forma piramidal, partindo de uma alargada base de
investigações envolvendo empreiteiras, diretores da Petrobras e políticos
individuais que vai se afunilando até o topo quando finalmente se alcançaria o
“comandante máximo” do esquema de corrupção. Na visão dos responsáveis, a
operação não poderia terminar sem oferecer essa “cabeça” ao país, e me parece
evidente que desde o início o alvo era a de Lula.
(...)
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André de Oliveira – 24.09.2016
Rogério Arantes – Cientista Político, Professor da Universidade de São Paulo – 24.09.2016.
IN El País Brasil.