sábado, 29 de julho de 2017

Será uma irresponsabilidade aprovar as privatizações de Doria no escuro


A concessão de serviços não é novidade. Há décadas os serviços de ônibus e de limpeza são geridos e operados pelo setor privado. Funcionam mal e a custo elevado. (...)
Avanços como o Bilhete Único, corredores de ônibus e centrais mecanizadas de reciclagem foram iniciativas de gestões progressistas, e não das empresas. Os ônibus são poluentes, barulhentos e têm chassis altos. Não se investe em educação para reduzir a geração de resíduos e aumentar a reciclagem e a compostagem. Isso não interessa às empresas.
Uma reforma na gestão municipal é necessária. A desestatização é uma opção que pode ser adotada, desde que se demonstrem os benefícios, com uma regulamentação clara, prevendo receitas e serviços a serem realizados, garantia de gratuidades e controle social.

Nabil Bonduki
Você assinaria uma procuração para um gestor, por melhor que fosse, para vender, alugar ou conceder o patrimônio que você acumulou ao longo da vida, sem estabelecer condições, preço e destinação da receita obtida?
Pois é isso que Doria quer dos vereadores paulistanos. Aprovar, em nosso nome, sem debate público, projetos de leis genéricos e de duvidosa legalidade, que visam a vender ou conceder ativos municipais. Uma irresponsabilidade.
Os PLs não definem os bens específicos a serem transacionados, a modalidade de desestatização em cada área, os valores de referência, o que será feito com eles e a garantia de que serviços serão prestados.
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Nabil Bonduki – Arquiteto, Vereador do Município de São Paulo – 07.2017.
IN Folha de São Paulo.


quarta-feira, 26 de julho de 2017

12 retrocessos em 12 meses de Temer


Em um ano, conseguiram impor este nível inédito de regressão social e democrática. Historicamente botaram a perder os três grandes pactos sociais do último século: o pacto lulista, com seus programas sociais; o pacto da Constituição de 1988, com a soberania do voto e a garantia de serviços públicos universais; e o pacto varguista, com sua legislação trabalhista e previdenciária. Se ficarem mais um ano e meio, esta turma destrói o Brasil. Os próximos pactos a serem atacados, sabe-se lá, podem ser a lei Áurea ou a Independência. 

Guilherme Boulos
Na última semana completou-se um ano da consumação do golpe parlamentar no Brasil. Foi tempo suficiente para as máscaras caírem. Eduardo Cunha, o comandante da operação, está preso há mais de seis meses em Curitiba. Uma leva de ministros caiu por denúncias de corrupção, a começar por Jucá, o homem que foi gravado explicando o passo a passo das transações que levaram Temer ao poder. Outros oito estão sendo investigados. Temer, que não é réu apenas pela prerrogativa constitucional, amarga uma aprovação inferior a 10%.
Mas um ano foi também tempo suficiente para o golpe mostrar a que veio. O que está em jogo é a aplicação de um programa que não foi eleito pelo povo brasileiro. Mais ainda, que jamais o seria. A única forma de uma agenda regressiva como a de Temer chegar ao poder seria burlando o voto popular. Ela não cabe na democracia. A sustentação do governo não está no voto nem no apoio popular, mas na garantia dos interesses da banca e do grande empresariado.
Ele precisa entregar o pacote. E tem que ser rápido. Foi a isso que o País assistiu no último ano. Pressionado por seus fiadores no mercado e sem nada a perder em relação à opinião pública, Temer promoveu uma incrível inversão do lema de Juscelino Kubitschek: o "avançar 50 anos em 5" foi substituído pelo "regredir 100 anos em 1".
É um período especialmente trágico da história nacional. Vejamos então, num resumido balanço, 12 dos principais retrocessos dos últimos 12 meses.
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Guilherme Boulos – 15.05.2017.
In Carta Capital.


domingo, 23 de julho de 2017

El secreto detrás de la increíble recuperación económica de Portugal: ¿cómo hizo para reducir el déficit y al mismo tiempo aumentar los salarios?



La experiencia portuguesa parece sustentar la idea de que la economía no es una ciencia exacta.
Los remedios estándar a los problemas económicos, como la austeridad extrema, no han llevado siempre a la solución ideal.
Portugal sigue buscando la suya, aunque en este caso lejos de camino de la ortodoxia económica del FMI.


Redacción BBC
En medio de las noticias económicas generalmente malas que han llegado del continente europeo desde el comienzo de la crisis financiera global de 2008, los resultados de Portugal han sobresalido por lo positivo.
En noviembre de 2015 llegó al poder en Portugal el primer ministro socialista Antonio Costa, poco después de que Grecia hubiese escapado por muy poco a un derrumbe financiero absoluto.
Pero mientras los griegos han estado inmersos desde entonces en una brutal terapia de austeridad económica que sigue sin reactivar la economía, los portugueses han logrado lo que a algunos equivale a la cuadratura del círculo: han rebajado el déficit fiscal al tiempo que han aumentado los salarios y las pensiones de los empleados y jubilados.
Mejor resultado
Según reporta la publicación británica The Economist, en 2016 Portugal redujo el déficit fiscal a la mitad hasta alcanzar el 2,1% del Producto Interno Bruto (PIB), el mejor resultado desde la transición a la democracia en 1974.
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Para continuar a leitura, acesse http://www.bbc.com/mundo/noticias-39494514?SThisFB





Redacción BBC – 05.04.2017.
IN BBC.


sexta-feira, 21 de julho de 2017

Terceirização irrestrita ameaça a sobrevivência da previdência social


O trabalho precarizado deve comprometer a arrecadação previdenciária, justamente quando o governo propõe uma draconiana reforma do setor.

Eduardo  Fagnani
Quando a barca neoliberal aporta em terras brasileiras, o trabalhador é convertido em uma espécie de Geni, alvo das pedradas retóricas de quem enxerga o custo da mão de obra como um obstáculo ao crescimento econômico. Ao defender a imposição de uma idade mínima para a aposentadoria, objetivo malogrado durante seu governo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso chamou de “vagabundos” aqueles que se aposentavam mais cedo.
Novos atores, velho discurso. Primeiro relator da reforma da Previdência na Câmara, o deputado Alceu Moreira, do PMDB, reeditou FHC ao afirmar, em dezembro passado, que o “tempo da vagabundização acabou”.
Confrontada com a reforma trabalhista pretendida pelo governo de Michel Temer, a acusação mostra-se falaciosa. Além de aprovar a terceirização irrestrita, que precariza ainda mais as relações de trabalho no Brasil, o governo pretende flexibilizar as negociações coletivas de modo a permitir jornadas de até 14 horas por dia, sem pagamento de horas extras. Ao esgotar a força de trabalho até o limite de suas capacidades, o governo parece querer substituir supostos vagabundos por escravos modernos.
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Para continuar a leitura, acesse   

https://www.cartacapital.com.br/revista/946/a-terceirizacao-irrestrita-ameaca-a-sobrevivencia-da-previdencia-social

 

 








Eduardo  Fagnani – Economista, Professor da Unicamp – .
In Carta Capital.


terça-feira, 18 de julho de 2017

Os números não mentem: rolo compressor midiático trabalha em favor das reformas


[na análise do conteúdo de Folha, EStadão, O Globo e Jornal Nacional] Parece que a frase ”imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados”, de Millor, tão repetida por noblat durante o governo Dilma, foi completamente esquecida pelas principais empresas de jornalismo. A cobertura pitbull do governo federal foi abandonada para dar lugar à cobertura poodle.

Em junho do ano passado, Otávio Frias Filho, diretor editorial e um dos herdeiros da Folha de S. Paulo, participou de uma conferência em Londres em que se discutiu o papel da mídia na crise política brasileira. Uma das convidadas era a jornalista Sue Branford, que criticou a falta de pluralidade da imprensa e apontou o maciço apoio dos grandes veículos de comunicação ao processo de impeachement de Dilma. Irritado, Frias tentou desqualificá-la ao dizer que sua visão correspondia à da "militância do PT" e completou dizendo que a "mídia não manipula ninguém". Em outro momento da conferência, defendeu a Folha ao dizer que a empresa tratou de forma igualmente crítica os governos FHC, Lula e Dilma - e que o mesmo aconteceria com Temer. 
Quem acompanha o noticiário com um mínimo de atenção e está com as faculdades mentais em ordem, sabe que essa é uma grande falácia. A cobertura da grande mídia é tendenciosa e alinhada aos interesses das forças políticas conservadoras, do mercado financeiro e à agenda ultra neoliberal hoje representada por PMDB e PSDB.
Essa semana foi lançado o novo site do Manchetômetro - uma iniciativa do cientista político e coordenador do Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP) João Feres Jr. da UERJ - qeu faz um monitoramento diário da cobertura dos principais veículos da grande mídia (Folha, Estadão, O Globo e Jornal Nacional) sobre temas como política e economia. É uma ferramenta que traz dados importantes para o debate político e ajuda a compreender o papel da mídia no processo democrático. Na nova versão do site, os visitantes podem produzir seus próprios gráficos escolhendo temas, veículos, partidos e o período desejado.
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Para continuar a leitura, acesse







João Filho – 30.04.2017.
IN The Intercept.

domingo, 16 de julho de 2017

Cultura do fracasso



Autor explica como o 4chan, um site de nerds, tornou-se a vanguarda da extrema direita nos EUA. Argumenta qu e jovens desempregados e sem namoradas votam em Trump porque ele encarna a ideologia da desesperança e que a esquerda deve enxerga-los como sintoma de um problema maior, que só ela pode resolver.


Dale Beran

Por volta de 2005, um link estranho começou a aparecer nos relatórios de origem de audiência de minha antiga webcomic.

Eu não entendia aquele site. Era um fórum de discussão, mas tinha um sistema de navegação obscuro. De modo contraintuitivo, era preciso clicar em "responder" para ler um tópico. Além disso, o conteúdo era uma bizarrice sem sentido.

Caso você não tenha adivinhado, o site era o 4chan.org. Era um subproduto de um fórum de discussão que eu já conhecia, o Something Awful, uma comunidade on-line com, à época, algumas centenas de nerds que gostavam de histórias em quadrinhos, videogames e, bem, coisas de nerd.

Diferentemente de fóruns semelhantes, o Something Awful pendia para piadas pesadas. Eu tinha uma conta no site, que usava de vez em quando para escrever sobre meus quadrinhos.

O 4chan tinha sido criado por Christopher Poole, um usuário de 15 anos do Something Awful.

Hoje em dia, o 4chan está no noticiário quase semanalmente.

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Para continuar a leitura, acesse http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2017/03/1867370-trump-os-nerds-do-4chan-e-a-nova-direita-dos-estados-unidos.shtml







Dale Beran – Escritor norteamericano, é autor de histórias em quadrinho. O texto aqui publicado foi veiculado originalmente na plataforma Medium – 19.03.2017.
Trad. De Clara Allain.
IN Folha de São Paulo, Ilustríssima.


quinta-feira, 13 de julho de 2017

O antimilagre econômico brasileiro


os limites das políticas implementadas foram intensificados pelas implicações do processo cumulativo. Tomados em conjunto, tais fatores parecem permitir uma interpretação mais frutífera das dificuldades observadas desde 2011, em que a política econômica buscou, sem sucesso, lidar com esse legado complexo do período anterior. Isso não significa que a crise atual seja reflexo dos erros cometidos pelos governos passados e dos excessos permitidos no período de abundância, como sugere a visão convencional, a fim de defender uma guinada liberal que não tende a gerar prosperidade, a não ser para os muito ricos. Significa, no entanto, que uma estratégia que combine crescimento com redução de desigualdades deve levar em consideração seus impactos sobre a estrutura produtiva, para que consiga evitar que se acumulem tensões que ponham a perder as conquistas alcançadas.

Fernando Rugitsky
A queda do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2016 confirma que estamos passando por uma das crises econômicas mais profundas da nossa história. Essa crise é mais bem compreendida à luz do período imediatamente anterior, que pode ser dividido em duas fases: i) o período do boom das commodities, entre 2004 e 2011, em que o crescimento acelerou-se em relação à tendência observada desde os anos 1980 e a desigualdade salarial declinou; e ii) o período de desaceleração, a partir de 2012.
A trajetória brasileira no período foi similar àquela de alguns países sul-americanos, que também passaram por uma aceleração do crescimento combinada à queda da desigualdade, até que a reversão do ciclo das commodities trouxesse seus impactos negativos. Seria possível supor que tais trajetórias podem ser explicadas essencialmente pelos efeitos da própria dinâmica dos preços das commodities e pelas políticas implementadas pelos governos de centro-esquerda que chegaram ao poder no período, em vários países da região. No entanto, olhar para a interação entre demanda agregada, distribuição de renda e estrutura produtiva permite uma compreensão mais profunda da curta fase auspiciosa e de seus limites, a fim de que as lições desse ciclo, que, ao menos no Brasil, se encerrou, sejam aprendidas.
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Fernando Rugitsky – Economista, Professor da FEA/USP – março, abril de 2017.
In Rumos, ABDE.

 

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Reforma trabalhista espanhola faz cinco anos: assim é a geração de jovens desencantados que ela deixou


Brasil usa reforma espanhola como modelo, mas mudança na legislação criou empregos precários.

Ramon Oliver
espanhola Alba Nicolás (27 anos) formou-se em Publicidade e Relações Públicas em 2013. Ao concluir o curso, ela se mudou para Barcelona, onde fez uma especialização e depois uma pós-graduação. Lá começou a trabalhar como estagiária em empresa de marketing digital com um salário de 150 euros (cerca de 556 reais) por mês a título de “ajuda de transporte”. “Fui contratada para ser formada community manager, mas tudo o que aprendi foi por minha conta e na base da tentativa e erro. Tinha um tutor que corrigia o meu trabalho e o enviava ao cliente, mas ele nunca tinha tempo para me formar”, conta. Ela estava na empresa havia um ano e nove meses quando descobriu que não tinham pago a previdência social um único mês. Quando denunciou a empresa, seus chefes foram obrigados a oferecer-lhe um contrato permanente. “35 horas por semana, com um salário que continuava deixando muito a desejar e aguentando os maus modos no tratamento pessoal”. Nove meses depois, foi despedida.
Alba é uma millennial, geração dos nascidos entre 1981 e 1994  e tinha 22 anos quando seu país aprovou uma reforma trabalhista que mudou a relação de trabalho entre as empresas e os funcionários —boa parte deles jovens como ela. E é justamente esta reforma, aprovada em 2012 na Espanha, que o Governo do presidente Michel Temer usa como principal referência para a sua proposta de reforma trabalhista, que pode ser votada nesta terça-feira [11.07.2017] pelo plenário do Senado. A geração de Alba representará 35% da força de trabalho global em 2020, de acordo com o Manpower Group.
O conceito de millennial tornou-se uma marca global. Deles se disse que são a geração mais preparada da história; que estão permanentemente conectados porque cresceram com a Internet e as novas tecnologias; que o dinheiro não é sua prioridade; que o que buscam são experiências motivadoras com as quais possam crescer; que preferem trabalhar em empresas comprometidas com o meio ambiente e a sociedade; que não querem ouvir e nem falar de um horário das 9h às 18h, mas de modelos flexíveis e por resultados; que são empreendedores; que entendem como ninguém a nova economia, porque a vivem em primeira pessoa como consumidores do UberAirbnb, Wallapop...
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Ramon Oliver – 11.07.2017.
IN El País Brasil.

segunda-feira, 10 de julho de 2017

'Refúgio cômodo', caixa 2 deveria ser punido com mais severidade, diz especialista em política e corrupção

 

Bruno Speck – “Em alguns países, como o Canadá, há um sistema que aloca os recursos de acordo com a aprovação dos partidos. O governo reembolsa o cidadão que fez a doação.
Nos EUA, há o sistema de matching funds: a cada US$ 100 que um doador privado deu a um partido, o Estado paga mais US$ 100.
E também há outro sistema em que o cidadão recebe um tipo de vale eleitoral, que pode destinar a partidos políticos.
Estas três modalidades seguem uma linha de distribuição dos recursos públicos que leva em conta o mercado político, ou seja, o apelo político que os partidos têm junto aos cidadãos.
Se os partidos não têm capacidade de convencer os cidadãos a fazer pequenas doações, o Estado não complementará recursos”.

 

Camilla Costa 
Para conseguir combater de maneira mais eficiente o financiamento ilícito de campanhas políticas - exposto de maneira generalizada com as delações da Odebrecht na Operação Lava Jato - o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) precisa de "mais auditores e menos juristas".
A afirmação é do cientista político alemão radicado no Brasil Bruno Wilhelm Speck, professor da USP e especialista em corrupção e dinheiro na política.
Ele afirma que o combate às práticas de corrupção reveladas pela investigação - o pagamento de propinas e as doações ilegais a campanhas políticas - só pode ser feito com um cruzamento de dados mais eficiente sobre o dinheiro declarado por políticos e partidos e com punições mais duras para crimes como o caixa 2.
O caixa 2 é um registro paralelo, ilegal, que permite que empresas movimentem recursos não contabilizados - e evitem a incidência de impostos sobre estes. O dinheiro no caixa 2 pode ser usado para financiar vários tipos de atividades - incluindo campanhas eleitorais e subornos.
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Para continuar a leitura, acesse   http://www.bbc.com/portuguese/brasil-39588333

 

 

 


 


Camilla Costa – 13.04.2017.
Bruno Speck – Cientista Político, professor da USP.
IN BBC Brasil.

sexta-feira, 7 de julho de 2017

Por dois segundos eu vi o Brasil que havia superado a escravidão dos negros


Por dois segundos eu vi um Brasil que havia superado a escravidão dos negros e o extermínio dos índios e dado chances iguais para todo mundo; não esse país que faz pacto atrás de pacto através dos séculos para manter inalterada a nossa catástrofe. Era um país bonito.

 

Antônio Prata
Sabe quando você sonha que está no seu quarto, mas não tem nada a ver com o seu quarto, mas sente que é o seu quarto? Foi tipo isso. Saí do elevador do hotel com a certeza de que estava no Brasil –afinal, ao entrar no elevador, eu estava no Brasil–, mas não parecia o Brasil.
Vi, no hall, uns 20 adolescentes bem vestidos, saudáveis, aparelhos nos dentes, cortes de cabelo estilosos; uns conversavam em rodinhas, outros ouviam música em seus fonões de ouvido, estirados nas poltronas com aquela mistura de arrogância e insegurança típica dos 15 anos, quando você pensa que sabe tudo e sabe que não sabe nada ao mesmo tempo. O detalhe que fez eu me sentir dentro e fora do Brasil é que os garotos eram todos negros, pardos, morenos.
Me senti no Brasil porque os meninos tinham a cor e a fisionomia da maioria dos brasileiros. Fora do Brasil porque a maioria dos meninos brasileiros com a cor e a fisionomia daqueles ali não costuma frequentar lobbies de hotéis, bem vestidos, de aparelhos nos dentes, cortes de cabelo estilosos, fones nos ouvidos, estirados nas poltronas. Costumam carregar as malas, limpar os quartos, sim, senhor, não, senhor, obrigado, senhor, disponha, senhor.
(...)

Para continuar a leitura, acesse http://m.folha.uol.com.br/colunas/antonioprata/2017/04/1871949-por-dois-segundos-eu-vi-um-brasil-que-havia-superado-escravidao-dos-negros.shtml?cmpid=compfb

 







Antônio Prata – Escritor – 02.04.2017.
IN Folha de S. Paulo.


terça-feira, 4 de julho de 2017

Medidas do STF mostram desequilíbrio



A diferença entre a situação anterior e a atual é que o afastamento —e posterior prisão— de Cunha funcionava para legitimar o polêmico impedimento de Dilma, ainda em curso naquele momento. Era preciso "lavar" o procedimento que visava derrubar a petista. Agora que é outro o presidente da República denunciado, o tratamento mudou.


André Singer

As duas decisões tomadas nesta sexta pelo Supremo Tribunal Federal (STF) lançam, outra vez, dúvidas sobre a isenção da Justiça nesta longa e tenebrosa crise. Ao soltar o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures e devolver o mandato ao senador Aécio Neves, ficam questionadas medidas resolvidas em fases anteriores, as quais tiveram importante influência sobre o processo político.

Compare-se o tempo de estadia, no mesmo cubículo da Polícia Federal, destinado ao então líder do governo Dilma no Senado, Delcídio do Amaral, e, agora, ao assessor de Temer. Preso em novembro de 2015, Amaral ficou detido 85 dias e só saiu porque concordou em fazer delação premiada. A peça extorquida por meio do que hoje a família Loures chama de condições torturantes tinha como centro a afirmação de que Lula e Dilma conheciam o esquema de corrupção na Petrobras.
O vazamento da colaboração "voluntária" de Delcídio virou edição extra da revista "Isto É" no meio da semana, com direito a uma extensa cobertura eletrônica. Dois dias depois o ex-presidente Lula sofria condução coercitiva. No domingo subsequente, veio a gigantesca manifestação de rua, a qual iria selar o destino político de Rousseff.
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André Singer – Cientista Político, Professor da USP – 01.07.2017.
In Folha de S. Paulo.

domingo, 2 de julho de 2017

Desigualdades urbanas


Uma das dimensões centrais para as desigualdades urbanas é o desenvolvimento de políticas nacionais para habitação, serviços urbanos e planejamento. A partir de 2003, as políticas do Ministério das Cidades representaram passos importantes (mas não suficientes) para a recomposição da presença federal no setor. Verificaram-se avanços na institucionalização das políticas urbanas no Brasil, com a constituição de fundos de financiamento da provisão habitacional de interesse social, conselhos e conferências participativos, planos setoriais para habitação, saneamento e resíduos sólidos, e programas de incentivo à promoção local de planos diretores participativos, regularização fundiária e planos locais de habitação. Esse sistema em construção, entretanto, não chegou a ser alimentado por recursos vultosos. Estes só chegaram a partir de 2009 e orientados para intervenções formatadas com outra lógica, de fomento à demanda (o programa Minha Casa Minha Vida), embora o PAC tenha realizado intervenções importantes de urbanização em muitas cidades. As feições do Minha Casa Minha Vida têm gerado resultados contraditórios. 

Eduardo Marques
Os desafios associados à construção de boas condições urbanas e de vida nas últimas décadas no país têm sido enormes, não apenas pelo baixo desenvolvimento econômico, pela presença de precariedade e pobreza e pelas grandes diferenças regionais, mas também pela velocidade das transformações ocorridas – a população urbana passou de 13 milhões de pessoas em 1940 para 31 milhões em 1960, 80 milhões em 1980 e 160 milhões em 2010.
O balanço desses processos deve ser realizado com cuidado, afastando tanto narrativas excessivamente otimistas quanto retratos catastrofistas. O saldo varia substancialmente dependendo do assunto considerado, da escala de cidade e da região do país. Essa heterogeneidade se associa à baixa presença federal nas políticas públicas que incidem diretamente sobre as cidades, diferentemente das políticas sociais, onde a regulação federal tem criado maior homogeneidade. Apesar do inegável avanço dos últimos anos, restam grandes desafios de produção de capacidades estatais em nível local, de financiamento (em vários níveis) e de regulação da terra urbana e dos serviços contratados ou concedidos a empresas privadas. Esse quadro geral, entretanto, varia muito segundo os elementos, políticas e dimensões considerados.
Uma primeira dimensão geral diz respeito à população de nossas cidades. Na maior parte dos casos, nossas cidades têm crescido a
taxas cada vez menores desde os anos 1980, alcançando níveis bastante reduzidos nos últimos anos. Isso foi o resultado de uma combinação de fatores. 
(...)




Eduardo Marques – Cientista Político, Professor da USP – s.d.

In Oxfam.