Por dois segundos eu vi um Brasil que havia superado a escravidão
dos negros e o extermínio dos índios e dado chances iguais para todo mundo; não
esse país que faz pacto atrás de pacto através dos séculos para manter
inalterada a nossa catástrofe. Era um país bonito.
Antônio Prata
Sabe quando você sonha que está no seu quarto, mas
não tem nada a ver com o seu quarto, mas sente que é o seu quarto? Foi tipo
isso. Saí do elevador do hotel com a certeza de que estava no Brasil –afinal,
ao entrar no elevador, eu estava no Brasil–, mas não parecia o Brasil.
Vi, no hall, uns 20 adolescentes bem vestidos,
saudáveis, aparelhos nos dentes, cortes de cabelo estilosos; uns conversavam em
rodinhas, outros ouviam música em seus fonões de ouvido, estirados nas
poltronas com aquela mistura de arrogância e insegurança típica dos 15 anos,
quando você pensa que sabe tudo e sabe que não sabe nada ao mesmo tempo. O
detalhe que fez eu me sentir dentro e fora do Brasil é que os garotos eram
todos negros, pardos, morenos.
Me senti no Brasil porque os meninos tinham a cor e
a fisionomia da maioria dos brasileiros. Fora do Brasil porque a maioria dos
meninos brasileiros com a cor e a fisionomia daqueles ali não costuma
frequentar lobbies de hotéis, bem vestidos, de aparelhos nos dentes, cortes de
cabelo estilosos, fones nos ouvidos, estirados nas poltronas. Costumam carregar
as malas, limpar os quartos, sim, senhor, não, senhor, obrigado, senhor,
disponha, senhor.
(...)
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Antônio Prata – Escritor – 02.04.2017.
IN Folha de S. Paulo.