os limites das políticas implementadas foram intensificados pelas
implicações do processo cumulativo. Tomados em conjunto, tais fatores parecem
permitir uma interpretação mais frutífera das dificuldades observadas desde
2011, em que a política econômica buscou, sem sucesso, lidar com esse legado
complexo do período anterior. Isso não significa que a crise atual seja reflexo
dos erros cometidos pelos governos passados e dos excessos permitidos no
período de abundância, como sugere a visão convencional, a fim de defender uma
guinada liberal que não tende a gerar prosperidade, a não ser para os muito
ricos. Significa, no entanto, que uma estratégia que combine crescimento com
redução de desigualdades deve levar em consideração seus impactos sobre a
estrutura produtiva, para que consiga evitar que se acumulem tensões que ponham
a perder as conquistas alcançadas.
Fernando Rugitsky
A queda do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2016 confirma que estamos
passando por uma das crises econômicas mais profundas da nossa história. Essa
crise é mais bem compreendida à luz do período imediatamente anterior, que pode
ser dividido em duas fases: i) o período do boom das commodities, entre 2004 e
2011, em que o crescimento acelerou-se em relação à tendência observada desde
os anos 1980 e a desigualdade salarial declinou; e ii) o período de
desaceleração, a partir de 2012.
A trajetória brasileira no período foi similar àquela de alguns países
sul-americanos, que também passaram por uma aceleração do crescimento combinada
à queda da desigualdade, até que a reversão do ciclo das commodities trouxesse seus
impactos negativos. Seria possível supor que tais trajetórias podem ser
explicadas essencialmente pelos efeitos da própria dinâmica dos preços das commodities
e pelas políticas implementadas pelos governos de centro-esquerda que chegaram
ao poder no período, em vários países da região. No entanto, olhar para a interação
entre demanda agregada, distribuição de renda e estrutura produtiva permite uma
compreensão mais profunda da curta fase auspiciosa e de seus limites, a fim de
que as lições desse ciclo, que, ao menos no Brasil, se encerrou, sejam
aprendidas.
(...)
Fernando Rugitsky – Economista, Professor da FEA/USP – março, abril de 2017.
In Rumos, ABDE.