terça-feira, 29 de agosto de 2017

'Salvadores da pátria' costumam sabotar democracia em vez de salvá-la


O paradoxo some quando se distinguem três níveis de participação política: o do eleitor, o do político profissional e o do ativista.
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Os três níveis não se intercambiam, tampouco se excluem. Ao contrário. Sem o eleitor (daí a importância do voto obrigatório), a política seria apenas de conluios entre grupos de interesse e políticos profissionais. Nela teriam exclusividade os mais organizados, os mais bem relacionados, os mais endinheirados.

Angela Alonso
Saíram há pouco pesquisas com resultados à primeira vista paradoxais. A do Datafolha conta onde mora a popularidade do presidente. É no fundo do poço: 76% são pró-renúncia, 81% por impeachment e 83% por eleições diretas. Os cidadãos identificam o problema, a perda de capacidade de governar, e veem a saída da crise na saída do presidente. Maioria incontrastável grita "Fora, Temer".
Mas a aferição do DataPoder360, também de junho, informa aos apressados que 61% dos brasileiros preferem assistir ao fim de "House of Cards" tupiniquim do sofá de casa. Negam-se a ir às ruas demandar ao sistema político a troca imediata do mandatário avariado.
A antinomia deve assustar a parcela de ativistas e analistas, à esquerda e à direita, crentes de que diagnóstico correto —tomada de consciência ou pensamento racional— produz mobilização massiva.
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Para continuar a leitura, acesse http://m.folha.uol.com.br/colunas/angela-alonso/2017/07/1897581-salvador-da-patria-costuma-sabotar-a-democracia-ao-inves-de-salva-la.shtml



 

 

 


 

Angela Alonso – Socióloga, Professora da USP e Presidenta do CEBRAP – 01.07.2017.
IN Folha de S. Paulo.

domingo, 27 de agosto de 2017

O que vi nos 20 dias que passei em um grupo de apoiadores de Jair Bolsonaro no WhatsApp


Eles são jovens, antimídia, odeiam a Rede Globo e Reinaldo Azevedo (considerado comunista); defendem as Forças Armadas, o torturador Coronel Brilhante Ustra e se autodeclaram fascistas, xenófobos e homofóbicos; veja conversas.

Diógenes Muniz
Sexta-feira, 15 de abril, 1h da tarde. Jair Bolsonaro acena de dentro do Rolls-Royce de cerimônias usado para a posse dos presidentes brasileiros. O político do PSC (Partido Social Cristão) veste a faixa presidencial sobre o terno preto e usa óculos Thug Life (aqueles que cobrem os olhos de quem supostamente acaba de “mitar” na internet). Sob a montagem, uma legenda sugere: “Se você acredita que isso se tornará realidade, deixe o seu amém”.
Em poucos segundos, améns vindos de vários cantos do país tomam a tela. Emojis com mãos ao alto ou rezando, além de carinhas felizes com lágrimas e corações coloridos aparecem ao lado das exaltações religiosas.
Criado em outubro de 2015, o grupo Direitas Já tem cerca de 170 membros de todas as regiões do Brasil. A maioria dos integrantes é jovem, na faixa dos 18 aos 30 anos. Entre os números que constam em sua lista de membros estão os de Eduardo Bolsonaro e de seu pai, Jair.
Nenhum dos dois é ativo. Bolsonaro pai nada publica ou lê. Já o filho (ou sua equipe) às vezes joga vídeos contra o governo e a esquerda. Suas interações são recebidas com uma profusão de emojis de aplausos em apoio ao “Bolsokid”, como é carinhosamente apelidado pelos seguidores.
Um dos mais participativos do fórum, o cearense Janderson Guerra, 22, define o Direitas Já como uma reunião de “jovens, estudantes universitários de direita, conservadores e cristãos”.
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Diógenes Muniz – 10.05.2016.
IN Ponte Jornalismo (Reproduzido por Ópera Mundi).


sexta-feira, 25 de agosto de 2017

O golpe final

 

o verdadeiro resultado dessa estratégia [conciliatória do Governo Lula] está evidente hoje. Nunca o Brasil viu tamanha regressão social e convite à espoliação do mundo do trabalho.

Vladimir Safatle

Aqueles que, nas últimas décadas, acreditaram que o caminho do Brasil em direção a transformações sociais passava necessariamente pelo gradualismo deveriam meditar profundamente nesta semana de julho.
Não foram poucos os que louvaram as virtudes de um reformismo fraco porém seguro que vimos desde o início deste século, capaz de paulatinamente avançar em conquistas sociais e melhoria das condições de vida dos mais vulneráveis, enquanto evitava maiores conflitos políticos graças a estratégias conciliatórias.
"Há de se respeitar a correlação de forças", era o que se dizia. Para alguns, isso parecia sabedoria de quem lia "A Arte da Guerra", de Sun Tzu, antes de reuniões com José Sarney e a lama do PMDB. Eu pediria, então, que meditássemos a respeito do resultado final de tal sabedoria.
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Vladimir Safatle – Filósofo, Professor da USP – 18.07.2017.
IN Folha de S. Paulo.


terça-feira, 22 de agosto de 2017

Venezuela sem fake News

 

Esqueça muito do que você leu por aí: não há catástrofe humanitária nem Maduro está para cair; mas há manifestantes quase todos os dias nas ruas, e eles não são “terroristas”, como dizem os apoiadores do governo.

Natália Viana
Na segunda-feira, 5 de junho, a Venezuela amanheceu com o mesmo presidente, Nicolas Maduro, como vem acontecendo desde que ele sucedeu Hugo Chávez, em 2013. Mais uma decepção para muitos dos manifestantes que têm lotado as ruas de diversas cidades do país nos últimos dois meses. Corriam boatos, de alcance multiplicado por correntes de WhatsApp, de que Maduro iria fugir do país no dia anterior. Até uma conhecida vidente previra sua fuga, dizia uma das mensagens. Era dito e certo.
Assim como nesse episódio, tudo o que acontece na Venezuela é cercado de desinformação e enevoado pelas fake news espalhadas por apoiadores do governo e da oposição. Na política venezuelana, tudo é espetáculo. Por isso, esqueça muito do que você leu por aí: a Venezuela não está vivendo uma catástrofe humanitária pela falta generalizada de alimentos; o governo de Nicolás Maduro não vai cair amanhã; a polícia nacional não está massacrando manifestantes a rodo nas ruas. Mas também não é verdade que tudo está bem e que as manifestações e a violência em torno delas são fruto de “terroristas” armados, como dizem os apoiadores do governo.
Nossa reportagem passou três semanas no país para ouvir o que dizem os venezuelanos e seus líderes. Logo no primeiro dia, já caímos numa marcha da oposição na zona leste de Caracas. Desde o começo de abril, elas têm sacudido a capital: a cada dois dias há um novo protesto massivo, e as ruas amanhecem como um cenário de guerra. Em todas as principais avenidas, há caminhões antidistúrbios ao lado de uma fileira de guardas da Polícia Nacional Bolivariana portando armas longas. Soldados do Exército com seus uniformes verde-oliva também ocupam esquinas e locais-chave para intimidar aqueles que vão protestar. Boa parte das principais avenidas de rápido acesso aos locais de encontro das marchas é interditada pelas forças do governo, impedindo o fluxo de manifestantes. As estações do metrô fecham. Algumas empresas liberam seus funcionários em horários alternativos para evitar o caos.
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Para continuar a leitura, acesse http://apublica.org/2017/06/venezuela-sem-fake-news/

 






Natália Viana – 13.06.2017.
In A pública.


domingo, 20 de agosto de 2017

Capitalismo jaboticaba


flexibilizar a lei trabalhista, especialmente com a terceirização sem limite e o trabalho intermitente, não garante a mudança desse quadro.
Na verdade, outros problemas surgirão: os empregos serão mais precários, a renda dos trabalhadores e a capacidade de compra diminuirão.

Ricardo Patah
A devastação é total. Nem na ditadura militar houve uma ofensiva tão grande contra os direitos dos trabalhadores e suas representações sindicais.
O governo Michel Temer (PMDB) e o Congresso Nacional perpetraram tal golpe sem qualquer tipo de discussão com a sociedade, visando apenas a agradar à elite empresarial e financista.
Usou-se o pretexto de que a reforma trabalhista ajudaria na criação de empregos e na melhora da economia. No entanto, nenhum desses objetivos será atingido.
Logo após a aprovação das novas regras, começaram as demissões no Bradesco, na Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, através de planos de demissões voluntárias. O governo fez ampla divulgação da criação de algumas vagas, especialmente na agricultura. Mas há um detalhe: elas foram criadas pela legislação antiga, agora demolida.
O governo, que poderia ser o indutor do crescimento econômico, não tem recursos nem mesmo para manter a máquina pública em funcionamento. Corta despesas em serviços essenciais, como saúde, educação e segurança.
Sobram verbas, porém, para as emendas dos parlamentares que votam em benefício do Palácio do Planalto-foi liberado R$ 1 bilhão nos dois últimos meses.
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Ricardo Patah – Presidente Nacional da União Geral dos Trabalhadores – 22.07.2017.
In Folha de S. Paulo.

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

“O distritão não existe em nenhuma democracia consolidada”




Para especialista, o sistema eleitoral proposto pelo PMDB, usado em países como o Afeganistão, aprofunda problemas atuais do Brasil.


Renan Truffi
Principal bandeira do PMDB para a reforma política, o sistema eleitoral conhecido como distritão ganhou força há algumas semanas por ter apoio do [então] vice-presidente Michel Temer e do [então] presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB/RJ). De acordo com a proposta, a escolha dos deputados federais e estaduais seria feita da mesma forma como hoje ocorrem as eleições para o Executivo, por meio de escolha majoritária: os mais votados ganham. Apesar de ter regras simples, o formato não é muito popular no mundo. Um dos poucos países que adotou o sistema é o Afeganistão, que ainda não tem partidos organizados após um ano de ocupação.
Em entrevista à Carta Capital, Yuri Kasahara, doutor em Ciência Política no Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ) e pesquisador-sênior do Norwegian Institute for Urban and Regional Research, explica como funciona na prática esse formato eleitoral em comparação com o atual modelo. Para ele, o distritãqo enfraquece os partidos e aprofunda os problemas do sistema político brasileiro: “É um sistema que favorece a peemedebização dos outros partidos, afirma”.
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Renan Truffi – 05.05.2015.
Yuri Kasahara – Doutor em Ciência Política no IUPERJ.
IN Carta Capital.





Simples, ruim e irresponsável


Não há sistema eleitoral perfeito. Sempre há prós e contras. Simplesmente dizer que o sistema atual gera esta ou aquela distorção não é suficiente. Sobretudo sem se levar em conta as distorções que resultarão do sistema proposto. Só pesando as distorções do atual e o do proposto é que se poderia responder a pergunta: vale a mudança? No caso, não vale.
O Distritão é o ponto culminante do discurso irresponsável em favor da mudança, de que a 'reforma', qualquer reforma, seria urgente e necessária.
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A essência da democracia moderna é a competição eleitoral e esta, logicamente, só pode ocorrer se os eleitores Têm opções, quando o número de candidaturas excede o de vagas. Limitar candidaturas é restringir a competição, é fomentar cartéis.


Fernando Limongi
A reforma eleitoral começou a ser votada. A grande invenção de Michel Temer, o distritão, foi aprovado pela Comissão Especial da Reforma Política. Difícil pensar em algo pior. O sistema pregado pelo presidente é primário. O seu resultado prático é previsível: aumentar as taxas de reeleição, bloqueando a possibilidade de renovação da Câmara.

Em sistemas majoritários, como o distritão, potenciais candidatos sabem que o sarrafo é alto, que há grandes chances de que não obtenham os votos necessários para se eleger. Temendo morrer na praia, a maior parte retira o time de campo. Só sai candidato quem parte de um patamar expressivo de votos, o que os deputados em exercício sabem ter.

Do ponto de vista do eleitor, o resultado é a desconsideração completa das preferências da maioria dos votantes. Se você votar em alguém que não se elege, seu voto é simplesmente jogado no lixo. Pelos cálculos de Jairo Nicolau, se o distritão tivesse sido aprovado na reforma Cunha, este seria o destino de um terço dos votos na eleição de 2014.
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Fernando Limongi – Cientista Político e Professor da USP – 14.08.2017.

IN Valor Econômico.