terça-feira, 2 de janeiro de 2018

A batalha contra o autoritarismo não acabou



O Brasil não fez o ajuste de contas necessário com sua trajetória autoritária, de Vargas aos militares. Tivemos muitos avanços nas últimas décadas democráticas, mas não soubemos mostrar, sobretudo aos mais jovens, como vivemos hoje melhor do que no passado. Pior: a crise política prolongada e a necessidade de remodelar o modelo de Estado para que ele seja um excelente provedor de serviços públicos são dois fatores que estão minando a confiança na democracia. Por isso, é urgente que as lideranças políticas e sociais saibam que se não ocorrer uma reformulação profunda no modus operandi do sistema político e da administração pública, estará em jogo não o governante de plantão, mas a capacidade de sustentar o próprio regime democrático.

Fernando  Abrúcio
Há uma data que minha geração não esquece: 15 de janeiro de 1985. Neste dia, Tancredo Neves, candidato de oposição ao regime militar, venceu a eleição indireta à Presidência da República. Depois de quase 21 anos de autoritarismo, o país voltava à democracia. Não foi um caminho fácil, numa transição "lenta, gradual e segura", como definira o general Golbery. Além disso, a morte de Tancredo e a posse de Sarney mantiveram o suspense em relação ao efetivo ocaso da ditadura. Mas parecia que o final feliz tinha chegado quando a Constituição de 1988 foi promulgada, em 5 de outubro de 1988. A partir daí, tivemos o mais longo período democrático de nossa história. Porém, alguns fantasmas autoritários começam a rondar o Brasil novamente.
Os riscos à democracia estão na sociedade e na classe política. São grupos cada vez maiores de brasileiros que creem cada vez menos no jogo democrático, e políticos que fazem discursos que desrespeitam princípios básicos do Estado de direito – o pior é que um conjunto importante do eleitorado apoia essa visão de mundo. Soma-se a isso a perda de poder e coerência de muitas instituições após quase três anos de crise política.
Um primeiro indício assustador da sociedade brasileira foi dado pela pesquisa Medo da Violência e Apoio ao Autoritarismo, realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com Datafolha.
(...)






Fernando Abrúcio – doutor em ciência política pela USP e coordenador do curso de administração pública da FGV-SP – 20.10.2017.
IN Valor Econômico.