Por trás dos escândalos,
há sempre contratos milionários, mas pouco se fala das empresas corruptoras; é
preciso foco especial no sistema financeiro.
Carlos Zarattini
O ano de 2012 começa com o Congresso Nacional diante do desafio
histórico de estabelecer um marco legal para a vigência dos valores éticos nas
relações entre o público e o privado no país.
Trata-se da apreciação do projeto de lei 6826/2010, encaminhado ao
Congresso pelo ex-presidente Lula, para contornar a falta de uma legislação que
responsabilize pessoas jurídicas em atos contra a administração pública
nacional e estrangeira, em especial pelos atos relacionados à corrupção.
No noticiário, dificilmente se fala do papel das empresas corruptoras
nas tramas que solapam os cofres públicos. Não há corrupção sem corruptor e,
por trás de todos os escândalos, normalmente há disputas milionárias por
contratos.
Há uma tendência de resumir todos os males ao setor público e aos
políticos, mas a verdade é que segmentos da iniciativa privada estão ligados
aos recorrentes escândalos e ao superfaturamento. Isso não acontece só no
Brasil, mas também em democracias já consolidadas.
Empresas que usam artifícios que não são republicanos para obter favores
arruínam os princípios morais, semeiam maus exemplos e impregnam a sociedade do
sentimento de que se pode levar vantagem em tudo.
O projeto de lei dispõe sobre a responsabilidade administrativa e civil
de pessoas jurídicas e dá mais um passo nas ações de combate à corrupção que
estão sendo adotadas desde 2003.
Ele é mais rigoroso e abrangente que a Lei de Licitações e inclui, por exemplo,
punições a atos de corrupção relacionados ao âmbito tributário, ao sistema
bancário público e às agências reguladoras.
Cumpriremos obrigações assumidas perante órgãos como a ONU, a OEA e a
OCDE. O projeto de lei prevê multas e sanções administrativas, como a proibição
de contratos com o setor público.
Uma comissão especial na Câmara da qual sou relator tem realizado
audiências públicas para ouvir empresários, juristas e órgãos de controle.
Vamos colocar o Brasil no rol dos países que já contam com uma legislação que
responsabiliza pessoas jurídicas por atos de corrupção, como os EUA (1977), a
Espanha (1995) e mais recentemente o Reino Unido (2010).
O projeto prevê também a responsabilização objetiva das empresas,
afastando a discussão sobre a culpa ou dolo da pessoa física na prática da
infração.
Retira-se também a necessidade de identificação da autoria da conduta,
com as dificuldades inerentes de comprovação dos elementos subjetivos
envolvidos na caracterização do ilícito. Impõe-se a responsabilização da pessoa
jurídica, uma vez comprovado o fato, o resultado e o nexo causal entre eles.
Isso não significa, porém, eliminar eventual responsabilização da pessoa física
em processo apartado.
Defendemos ênfase na responsabilização administrativa e civil porque a
realidade mostra que esses processos têm se revelado muito mais rápidos e
efetivos no combate à corrupção.
É preciso também um foco especial no sistema financeiro, com punições
para as omissões de funcionários públicos que fiscalizam o setor e também para
a ação de inescrupulosos operadores.
Na crise de 2008, nos Estados Unidos, foi possível observar que
operadores do sistema financeiro estiveram na gênese dos problemas e, a
despeito da existência de lei, não foram punidos.
Mas, para a transformação do projeto em lei, vencendo as naturais
resistências, será fundamental a participação da sociedade e sua manifestação
favorável a essa histórica medida.
Carlos Zarattini – Economista com especialização
em engenharia de transportes, é deputado federal (PT-SP) – 22.01.2012
IN “Folha de São Paulo” – http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/21346-e-hora-de-punir-os-corruptores.shtml