Chega
de preconceito. Adolescentes criados por mães lésbicas vão melhor na escola,
têm mais amigos e se sentem bem consigo mesmos. Precisa de mais?
Nanette Gastrell
Nos últimos 30 anos, diversos estudos têm demonstrado que a
orientação sexual dos pais não influencia o ajusstamento psicológico e social
das crianças. Mas alguns críticos ainda
questionam a legitimidade da criação de filhos em lares gays, lembrando que a
maioria dos adolescentes estudados nasceu em uniões heterossexuais antes que a
mãe se divorciasse e se assumisse como lésbica. Minha pesquisa vai além: eu
acompanho a primeira geração americana de famílias lésbicas planejadas, nas
quaias as mães já se identificavam assim antes da inseminação artificial.
Portanto, estudo seus filhos desde que nasceram. E constatei que, aos 17 anos,
eles se saíram ainda melhor, em alguns aspectos, que outros adolescentes da
mesma idade.
Os filhos das lésbicas tiveram melhor desempenho na escola e
nas interações sociais, por exemplo, do que garotos de famílias heterossexuais.
Também apresentaram menos problemas de comportamento, como agressividade e
violação de regras. No total foram 154 lésbicas ( Solteiras e com
companheiras) se inscreveram entre 1986 e 1992. Desde então, temos
reunido dados por meio de entrevistas e questionários. E os resultados
surpreenderam.
Para medir a qualidade de vida, foram pedidos aos 78
adolescentes filhos de lésbicas que completassem uma pesquisa com frases como “
Eu me dou bem com meus pais “ou mais “me sinto bem comigo mesmo” que deviam ser
avaliadas 0 ( discordo ) a 10 ( concordo totalmente ). As respostas foram
comparadas com as de 78 adolescentes pareados por sexo, idade e etnia. E não
foram encontradas diferenças entre os dois grupos, como era esperado. A
surpresa veio quando pedimos que descrevessem suas vidas em detalhes. Comprovou-se
que os filhos das lésbicas eram muito bons nas escolas, tinham diversos amigos
de longa data e fortes laços familiares. Numa escala de 1 a 10, eles deram 8,4
em média para o seu bem estar, o que não é comum estre adolescentes. E 93,4%
consideraram que suas mães são bons modelos a seguir, excepcionalmente para a
faixa etária.
Esse desempenho não é por acaso. As mães que participaram do
estudo se comprometeram em participar ativamente da vida dos filhos. Precisaram
educar todo mundo à sua volta sobre famílias lesbicas, do obstetra às
professoras. Também participaram de programas anti-bulying nas escolas. Elas
dedicaram muito tempo para tornar o caminho dos filhos o mais seguro e saudável
possível. Quase metade das crianças do estudo havia sido alvo de comentários
homofóbicos, porém souberam lidar com isso.
Apesar de todas essas evidências, ainda existe o mito de que
gays e lesbicas não podem ser bons pais, tal como diziam os juízes americanos
nos anos 70, ao negar a custódia dos filhos a homossexuais divorciados. Quando
as primeiras pesquisas indicaram que os filhos de gays e lésbicas estavam se
dando bem, os juízes argumentavam que não haviam estudos longitudinais
confirmando isso. Em 1982, um banco de esperma abriu as portas pela primeira
vez a lésbicas que queriam engravidar. Na época eu era uma pesquisadora da
Escola de Medicina de Harvard, e vi que um novo fenômeno social estava
surgindo. Por isso iniciei o NLLFS – o mais longo estudo já feito. Com ele, os
juízes já não podem levar adiante seu preconceito.
Nanette Gastrell – Psiquiatra e investigadora principal do Estudo Nacional
Longitudinal de Famílias Lésbicas dos EUA (NLLFS), em São Francisco. Em
depoimento a Eduardo Szklarz – fevereiro de 2013.
IN Super Interessante, Ed. 315 - http://super.abril.com.br/superarquivo/?edn=315Ed&yr=2013a&mt=fevereirom&ys=2013y