de uns
tempos para cá, esse mesmo presidencialismo mudou de caráter e a relação ficou
deficitária. Aliados de ocasião recebem seu quinhão de poder, mas já não
garantem a execução de programas. As tais “maiorias” são incapazes de fazer
reformas e pouco colaboram com os governos. Delas se espera, antes, que não
atrapalhem, aprovem “alguma coisa”, mas que, sobretudo, anulem a oposição e
garantam tranquilidade na esfera parlamentar, evitando o constrangimento de
CPIs e outros perrengues. Antes que se atribua responsabilidade exclusiva ao
PT, é bom dizer que nos Estados governados pela oposição as Assembleias
Legislativas têm, em regra, o mesmo padrão.
Carlos
Melo
É fato que durante algum tempo o presidencialismo
de coalizão do Brasil fez o seu papel: o antipático “é dando que se recebe” foi
impiedosamente apedrejado pela opinião pública, mas contribuiu para a
efetivação de importante agenda econômica e social. O País saiu da ditadura e
do caos inflacionário para um regime que distribuiu renda e fez considerável
inclusão. Modernizou-se em vários aspectos e, mesmo com tanta desinteligência
que há, é mais democrático do que jamais foi. Houve inegável avanço. Pode-se dizer
que o preço – na moeda corrente de cargos e recursos públicos que distribuiu –
valeu, já que a transformação não foi pequena. Política também é
custo-benefício, e o Brasil de hoje é melhor do que há 20 anos. Ademais, em
qualquer lugar, fazer reformas profundas é tarefa custosa.
Mas é necessário reconhecer que,
de uns tempos para cá, esse mesmo presidencialismo mudou de caráter e a relação
ficou deficitária. Aliados de ocasião recebem seu quinhão de poder, mas já não
garantem a execução de programas. As tais “maiorias” são incapazes de fazer
reformas e pouco colaboram com os governos. Delas se espera, antes, que não
atrapalhem, aprovem “alguma coisa”, mas que, sobretudo, anulem a oposição e
garantam tranquilidade na esfera parlamentar, evitando o constrangimento de
CPIs e outros perrengues. Antes que se atribua responsabilidade exclusiva ao
PT, é bom dizer que nos Estados governados pela oposição as Assembleias
Legislativas têm, em regra, o mesmo padrão.
Culpa dos governos que não têm
agenda, ou não têm agenda porque não acreditam na capacidade de suas coalizões
cumprirem acordos sem impor novos custos, tornando o processo de reforma mais
dispendioso que o mal que se procura curar? O fato é que há um vazio de
projetos, planos, propostas; um irritante vazio de Política com o “P”
maiúsculo. O Brasil chegou à perfeição ou houve uma rendição incondicional às
impossibilidades colocadas pela pequena política? Estamos longe, muito longe,
da perfeição.
Carlos
Melo – Cientista político, professor da Insper e autor de Collor – o ator e suas circunstâncias (Novo Conceito) – 16.03.2014
IN O Estado de São Paulo.