segunda-feira, 2 de março de 2015

Uma nova classe perigosa?


Uma mirada na formação do precariado europeu de uma perspectiva brasileira talvez também seja útil para problematizar aquela que constitui a grande contribuição de Standing ao debate público contemporâneo: o alerta sobre a natureza "perigosa", isto é, filo-fascista, desta nova classe. De fato, alienada, ansiosa, insegura, infantilizada, oportunista, cínica, passiva - tanto mental como politicamente -, além de detentora de um estado psíquico nebuloso. Não é de se estranhar, portanto, que, do ponto de vista político, o precariado seja considerado potencialmente hostil ao regime democrático, além de uma presa fácil dos apelos direitistas.

Ruy Braga
O livro de Guy Standing, O precariado: a nova classe perigosa (São Paulo, Autêntica, 2013), acabou de ser publicado no Brasil. Trata-se de uma dessas aguardadas análises que chegou na hora certa. Um dos mais impactantes livros sobre o mundo do trabalho lançado nas últimas décadas, ele já surgiu com ares de “clássico” por ser capaz de traduzir em dados o espírito de toda uma época: vivemos sob a sombra do “precariado”, isto é, um novo grupo de pessoas despojadas de garantias trabalhistas, submetidas a rendimentos incertos e carentes de uma identidade apoiada sobre o trabalho. Em larga medida, da qualidade da ação coletiva deste grupo depende o futuro dos movimentos sociais globais.
A descrição que Standing faz das razões pelas quais a globalização econômica por meio da flexibilidade do trabalho ampliou incessantemente o tamanho do precariado é verdadeiramente arrasadora. A mercantilização do trabalho associada tanto ao aprofundamento da concorrência intercapitalista quanto à financeirização do meio ambiente empresarial reviveu o pesadelo de Karl Polanyi. Como é sabido, para o grande sociólogo húngaro, ao açambarcar as três mercadorias fictícias – isto é, o dinheiro, o trabalho e a terra –, o capitalismo colocaria em risco o conjunto da reprodução social.
Em seu belo volume, Standing enfrentou os desafios levantados por Polanyi há exatos setenta anos. Além de criticar a liberdade de movimentos e a concentração dos capitais financeiros, ele denunciou os efeitos deletérios da submissão de parte substantiva do movimento sindical europeu e de setores predominantes do mainstream político social-democrata a um modelo de desenvolvimento socialmente irresponsável e ecologicamente insustentável. No entanto, seu foco principal é o advento e o destino histórico do precariado como uma nova classe em transformação.
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Ruy Braga – Professor do Departamento de Sociologia da USP e ex-diretor do Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania (Cenedic) da USP, é autor, entre outros livros, de Por uma sociologia pública (São Paulo, Alameda, 2009), em coautoria com Michael Burawoy, e A nostalgia do fordismo: modernização e crise na teoria da sociedade salarial (São Paulo, Xamã, 2003)  – 14.02.2014
IN Blog da Boitempo.