Operando no fio da navalha, o PT
procura, com enormes dificuldades, reencontrar o prumo. A decisão de apoiar a
cassação de Cunha, que precipitou a explosão do deputado carioca, bem como a
recusa em defender o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), mostra alguma vida no
interior da legenda. Resta ver se haverá força para mudar também a política
econômica. Nesse caso, a batalha que se aproxima ganharia algum sentido
positivo.
André
Singer
Em gesto irresponsável, o presidente da Câmara,
Eduardo Cunha, acabou por considerar admissível o pedido de impeachment contra
a presidente da República. Uma peça jurídica artificial, manipulada sem
escrúpulos, joga agora o centro das decisões nacionais em guerra estéril.
Convém afastar as ilusões: não haverá ganho nesta refrega.
Quanto a Cunha, o destino está traçado. Será
cassado pelos pares e, depois, esquecido pela história, que não se ocupa de
personagens menores. Mas, como homem-bomba, deixa abacaxi e tanto. Já pequena
diante dos desafios da crise econômica e da Lava Jato, a política fica mais
perdida na cerração provocada pela admissibilidade do impedimento.
Vozes até aqui sensatas da oposição e do mundo
jurídico sabem que não há base consistente para a solicitação de impeachment.
Repetidas declarações de personagens insuspeitos como Fernando Henrique
Cardoso, Geraldo Alckmin, Carlos Ayres Brito e Joaquim Barbosa atestam a
fragilidade da iniciativa. As supostas pedaladas fiscais não passam de operação
cotidiana de qualquer Executivo.
(...)
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André
Singer – Professor de Ciência Política da USP – 05.12.2015
In Folha de São Paulo.
O dia da infâmia
Jamais imaginei que pudéssemos chegar à
lama em que o gangsterismo de uns e o oportunismo de outros mergulharam o país.
O Brasil passou um ano emparedado entre a chantagem de Eduardo Cunha –que abusa
do cargo para escapar ao julgamento de seus delitos– e a hipocrisia da
oposição, que vem namorando o golpe desde que perdeu as eleições presidenciais
para o PT, pela quarta vez consecutiva.
Fernando
Morais
Minha geração testemunhou o que eu acreditava ter
sido o episódio mais infame da história do Congresso. Na madrugada de 2 de
abril de 1964, o senador Auro de Moura Andrade declarou vaga a Presidência da
República, sob o falso pretexto de que João Goulart teria deixado o país,
consumando o golpe que nos levou a 21 anos de ditadura.
Indignado, o polido deputado Tancredo Neves
surpreendeu o plenário aos gritos de "Canalha! Canalha!".
No crepúsculo deste 2 de dezembro, um patético
descendente dos golpistas de 64 deu início ao processo de impeachment da
presidente Dilma Rousseff.
A natureza do golpe é a mesma, embora os
interesses, no caso os do deputado Eduardo Cunha, sejam ainda mais torpes. E no
mesmo plenário onde antes o avô enfrentara o usurpador, o senador Aécio Neves
celebrou com os golpistas este segundo Dia da Infâmia.
(...)
Para continuar a leitura, acesse http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2015/12/1715297-o-dia-da-infamia.shtml
Fernando
Morais – Jornalista e escritor. É autor, entre outros, dos
livros "Chatô, o Rei do Brasil" e "Olga" – 04.12.2015.
In Folha de São Paulo, Tendências e Debates.