domingo, 10 de abril de 2016

Laboratório Espanha


Uma das maiores dificuldades atuais do Podemos é conseguir encontrar uma forma institucional democrática capaz de permitir que agrupamentos organizados em torno de reivindicações como essas continuem compartilhando a mesma plataforma política. Das 69 cadeiras (de um total de 350) conquistadas na eleição pela plataforma Podemos, nada menos do que 27 delas foram obtidas por diferentes organizações que se reuniram em torno de movimentos por autonomia na Catalunha, na Comunidade Valenciana e na Galícia. E cada um desses nós organizativos aspira ter uma bancada própria no parlamento. Processos semelhantes se dão em relação aos demais coletivos reunidos no Podemos.
 O atual esforço é para manter essa multiplicidade de grupos dentro da mesma plataforma política.

 
Marcos Nobre 
No século 20, a democracia de massas deu as caras em poucos momentos e em bem poucos lugares do planeta. Sua forma habitual foi a da representação por meio de partidos políticos organizados de maneira hierárquica e burocratizada. Progressivamente, esses partidos foram se tornando verdadeiras entidades paraestatais, com laços cada vez mais frouxos com a base da sociedade. Na passagem para o século 21, é a própria forma partido, típica do século passado que está em questão, duvidando-se de sua capacidade de representar sociedades que experimentaram novas formas de vida democráticas.
Um dos mais importantes laboratórios da nova experimentação se encontra na Espanha. Acontece ali um embate aberto entre as velhas formas partidárias do século 20 e as novas plataformas políticas do século 21. Do lado da "velha política" estão o Partido Popular (PP, direita) e o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE, esquerda). Do lado da "nova política", Podemos e Cidadãos. Na mais recente eleição, ocorrida em 20 de dezembro, deu impasse. Nenhuma formação consegue construir alianças de modo a obter maioria para governar. Visto da maneira tradicional, nenhum problema. Como se trata de uma monarquia parlamentarista, basta realizar novas eleições. Só que o impasse já não se dá mais em termos tradicionais.
De todas as revoltas democráticas que se espalharam pelo planeta a partir de janeiro de 2011, a Espanha conta entre os poucos lugares em que as energias de contestação tomaram forma capaz de mudar a institucionalidade. Os países da primavera árabe tiveram suas revoltas sufocadas por novas ditaduras e por guerras civis. Ou, como na Tunísia, estão com sua jovem democracia na UTI. A experiência grega foi sufocada pela austeridade. No Brasil, a adesão das principais forças políticas ao "centrão pemedebista" formado a partir do Plano Real travou temporariamente a mudança.
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Marcos Nobre – Professor da Unicamp e Pesquisador do CEBRAP – 201
IN Valor Econômico, edição impressa (republicado em blog do Josenildo Melo)