domingo, 5 de junho de 2016

Apocalipse do jornalismo



Normas e técnicas jornalísticas não são meros enfeitos para códigos ou lições esquecidas nos bancos da escola. São peças essenciais para a sobrevivência da democracia. Na lava-jato, o que deveria motivar uma custosa operação de checagem independente e edição autônoma derivou numa repetição inglória dos piores momentos do jornalismo do passado. A audição generosa e justa do chamado outro lado das denúncias, tanto na apuração de informações como em sua edição, não existiu.
O abuso de reportagens baseadas exclusivamente em fontes mantidas em sigilo tornou-se regra. Vazamentos com objetivo manipulatório foram a tônica. (...)
Não pode haver fracasso maior para quem ao longo dos anos aspirou a se legitimar como instituição pilar de uma jovem democracia. Veículos de mídia cederam ao populismo que inflama os ódios de classe e leva o país a vivenciar mais um golpe contra as instituições.

Mário Vítor Santos
A ruptura institucional em via de ser completada no Brasil é resultado direto da degradação do jornalismo posto em prática por quase todos os meios de comunicação no país. Os cuidados éticos foram sacrificados a tal ponto que o jornalismo promove a derrubada de uma presidente até agora considerada honesta.
Jornalismo deve informar os fatos de pontos de vista diferentes e contrários, encarnar ideias em disputa, canalizar o entrechoque de versões, sublimar antagonismos.
Veículos brasileiros, ao contrário, quase todos em dificuldades financeiras e assediados pelos novos hábitos do público, uniram esforços na defesa de uma ideia única. Compactaram-se em exageros, catastrofismo e idiossincrasias. Agruparam-se de um lado só da balança, fortes para nocautear um governo, mas fracos para manter sua própria razão de existir, a autonomia.
Poderia ser diferente.
(...)






Mário Vítor Santos – Jornalista ex-Ombudsman da Folha de São Paulo – 18.05.2016.
IN Folha de São Paulo.