quinta-feira, 30 de novembro de 2017

A constituição de 2015



Durante a breve vigência da Constituição de 2015, o Supremo conseguiu derrubar corruptos importantes porque, na luta para derrubar Dilma Rousseff, nenhum dos analistas que hoje se preocupam com equilíbrio institucional dava a mínima para isso. Os empresários, que hoje só querem estabilidade, inflavam patos e os ânimos. Os partidos de direita que bradavam contra Delcídio hoje são o governo e têm como prioridade se livrar da cadeia, nem que para isso tenham que livrar também os petistas que derrubaram.


Celso Rocha de Barros
O Supremo Tribunal Federal não conseguiu explicar à opinião pública por que Aécio não foi preso como foi Delcídio do Amaral. Tampouco conseguiu explicar por que suas decisões contra Aécio terão que ser referendadas pelo Senado, rota de fuga que foi fechada para Eduardo Cunha.
Se as decisões sobre o candidato da direita na última eleição presidencial estiverem corretas, as decisões sobre Delcídio e Cunha estavam erradas. Se as decisões sobre Delcídio e Cunha estavam certas, Aécio deveria estar preso.
Não sou constitucionalista, não tenho a pretensão de saber qual é o caso. Mas é evidente que, se todas essa decisões foram constitucionais, o Brasil teve outra Constituição durante a guerra para derrubar Dilma Rousseff.
 Não se trata, apenas, de um político corrupto escapando da Justiça. O caso de Aécio é representativo de uma tendência muito mais grave: desde que o PT caiu, a maré anti-corrupção virou.
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Celso Rocha de Barros – 16.10.2017.
In Folha de S. Paulo.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

Não me representa



Cresce na Justiça a pressão para legitimar candidaturas independentes de partidos – o que abre caminho para os outsiders da política.

Paula Sperb
Sob a mesa do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, repousa um recurso impetrado por dois amigos com uma demanda pouco convencional: ainda que um ganhe a vida como advogado e outro trabalhe no mercado financeiro, eles querem poder se candidatar aos cargos de prefeito e vice, respectivamente, no Rio de Janeiro sem estarem filiados a qualquer partido político – o que já haviam tentado em 2016, sem sucesso. A candidatura “autônoma” fere o artigo 14 da Constituição, segundo o qual a filiação partidária é condição imprescindível para participar do pleito. Postulantes a cargos eletivos são obrigados a estar ligados a uma das quase quarenta legendas políticas do país.
Motivada pela desconfiança da população em relação à estrutura político-partidária nacional, a iniciativa da dupla visa abrir caminho para candidaturas independentes que podem trazer personagens novos para o xadrez eleitoral. A discussão chega ao STF em um momento crítico. A desconfiança sobre as legendas cresceu pela terceira vez seguida de acordo com o Datafolha. Segundo a pesquisa, apenas 2% dos brasileiros “confiam muito” em partidos políticos. A maioria da população, sete em cada dez (69%), não confia nos partidos, e 28% confiam um pouco, de acordo com o levantamento.
O recurso apresentado pelo advogado Rodrigo Mezzomo, de 47 anos, e pelo administrador Rodrigo Rocha, de 45 anos, foi distribuído para o ministro Fux no começo de julho. “Queremos levantar a discussão e debater as possibilidades jurídicas sobre candidatos independentes no Brasil”, disse Mezzomo. De fato, eles buscam dar legitimidade a uma situação que já vem ocorrendo há muito tempo nas urnas – quando candidatos obscuros ou desconhecidos usam partidos tradicionais apenas para se eleger numa simbiose efêmera conhecida como “barriga de aluguel”. Assim que ganham as eleições, os candidatos simplesmente passam a ignorar as orientações do partido e se firmam como políticos independentes. A prática é adotada por muitos partidos para fermentar seus quadros e, por consequência, ganhar mais tempo nos programas eleitorais e ter mais repasses do Fundo Partidário.
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Para continuar a leitura, acesse http://piaui.folha.uol.com.br/nao-me-representa/







Paula Sperb – 24.07.2107.
 
IN Revista Piaui.

sábado, 25 de novembro de 2017

Violência no Rio tem sido enfrentada na base do remendo, escreve sociólogo


 As questões não se esgotam no aspecto conjuntural. As soluções sustentáveis na segurança pública também esbarram em problemas estruturais bastante sérios.

Cláudio Beato
As semanas passadas nos trouxeram à memória cenas com as quais não estávamos mais habituados. O poder público atônito e a sociedade amedrontada assistiram a conflitos entre facções criminosas transbordando nos bairros de classe média e alta do Rio de Janeiro, numa ilustração do que é o cotidiano de muitas comunidades pobres da cidade.
O surto de violência serviu para nos lembrar de que a crise política e econômica tem diversas faces sociais —e que estas, embora também sejam dramáticas, infelizmente não recebem a mesma atenção. A pauta monotemática dos últimos anos só tem sido quebrada quando somos surpreendidos por presídios rebelados, chacinas, ações do crime organizado, embates nas fronteiras etc.
A população brasileira convive com o medo permanente, e os eventos recentes no Rio resumem nossos dilemas.
A capital fluminense, segundo dados do ISP - Instituto de Segurança Pública, conheceu redução gradativa e notável na sua taxa de homicídios: do pico de 1994, quando se contavam 74 assassinatos para cada grupo de 100 mil habitantes, passou-se a 18,5/100 mil em 2015. No ano seguinte, contudo, o índice avançou para 20,5 e continua em ritmo crescente em 2017.
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Para continuar a leitura, acesse




Cláudio Beato – Sociólogo – 15.10.2017.
In Folha de S. Paulo, Ilustríssima.


quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Lacrou



Como anota o autor, a gíria tem por base –e acaba por reforçar– "a ideia de que debates, em princípio, admitem um fechamento irrevogável, e não são desprezíveis as consequências disso para as discussões concretas de que venhamos a tomar parte".
Fico tentado a chamar de lacradora essa ideia de que a epidemia de "lacrações" espelha e realimenta nosso ambiente de intolerância mútua, em que as cabeças parecem vedadas a tudo o que, contrariando certezas pré-moldadas, ameace obrigá-las a pensar.

Sérgio Rodrigues
Na revista "Piauí" deste mês, Antonio Engelke, doutor em ciências sociais pela PUC carioca, faz uma análise "progressista" –e por isso mais relevante– dos tiros no pé desferidos pelas políticas identitárias que caracterizam grande parte da esquerda atual, com sua ênfase nas ideias de pureza e essência manifestas em conceitos como "lugar de fala" e "apropriação cultural".
Trata-se de um debate que nada tem de simples, preto no branco. Não tentarei resumir aqui a argumentação nuançada do autor, que gasta seis páginas de letras miúdas para se distanciar tanto da condenação conservadora dos movimentos de afirmação de minorias quanto das armadilhas autoritárias e autossabotadoras que se apresentam em seu caminho.
O artigo é brilhante, e deixo aqui uma enfática recomendação de leitura. Vou comentar apenas o curioso caso línguístico pelo qual Engelke inicia seu argumento: o da gíria "lacrar", forte candidata a palavra mais eloquente e emblemática dos últimos anos no país.
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Sérgio Rodrigues – Jornalista e Escritor – 19.09.2017.
In Folha de S. Paulo.