MST entrega carta com 10
reivindicações consideradas 'urgentes' à presidenta.
Luiz Felipe Albuquerque
“Aqui está o que consideramos a vida, representada nos nossos alimentos,
sementes, poemas, artesanatos e nossos símbolos”, disse a dirigente do MST
Atiliana Brunetto, ao entregar a cesta de produtos do MST à presidenta Dilma
Rousseff, nesta quinta-feira (13/02).
Desde o início do governo Dilma, há três anos, que o MST exige uma
reunião com a presidenta para cobrar a realização da Reforma Agrária e mostrar
os problemas latentes do campo brasileiro.
Mas apenas depois da luta e da pressão social exercida pelos Sem Terra
na tarde desta quarta-feira (12/02), em Brasília, que a presidenta finalmente
decidiu ouvir as demandas do Movimento, que apresentou seus problemas mais
emergenciais neste último ano de mandato.
Na avaliação dos Sem Terra, grande parte da energia gasta nas lutas nos
últimos três anos serviram apenas para que o atual governo não retrocedesse nas
conquistas da última década.
“Toda nossa proposta de Reforma Agrária ficou no meio da estrada. Isso
criou uma insatisfação muito grande por parte dos Sem Terra”, disse Jaime
Amorim, da coordenação nacional do MST, à presidenta.
Durante a reunião, os Sem Terra levaram uma série de demandas à mesa em
torno das questões referentes aos problemas das famílias acampadas e assentadas
em todo o Brasil.
“Passem tudo o que puderem passar de informações para nós do que está
errado que faremos as mudanças”, se comprometeu a presidenta ao ouvir as
demandas e dizer que é preciso listar e fazer o que é urgente.
Dentre os pontos, Jaime relembrou a discussão em torno do índice de
improdutividade, que se iniciou desde o começo do governo Lula. “O governo tem
que criar as condições e enfrentar o problema”, cobrou o dirigente, ao afirmar
que é preciso enfrentar as forças mais conservadoras que compõem a gestão da
presidência.
Lançada no final do ano passado, a Medida Provisória da Reforma Agrária
previa a possibilidade das famílias assentadas venderem seus lotes, o que
permitiria uma regressão das conquistas da Reforma Agrária e uma reconcentração
da terra no país.
Segundo Débora Nunes, da coordenação nacional do MST, o agronegócio
também vislumbra as terras das famílias assentadas e estão dispostos a oferecer
muito dinheiro para conquistarem essas áreas.
“Isso pode estimular a venda, o que desmoralizaria o governo e a própria
Reforma Agrária”, destacou, ao apontar que seria um retrocesso das conquistas e
um aumento da concentração de terra no país.
“Concordo que não tem cabimento conceder na perspectiva da venda”, disse
Dilma, ao ponderar que é importante que as famílias sintam que a terra lhes
pertence, pois aumenta a “autoestima”.
Nesse sentido, a presidenta concordou em defender a proposta do
Movimento, que prevê o título de concessão de uso da terra, o direito à herança,
mas que a venda seja proibida.
Desapropriação de novas áreas
Durante o governo Dilma, pouco mais de 76 mil famílias foram assentadas,
segundo dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A
maioria desses números, entretanto, se refere à regularização fundiária na
Amazônia, e não decretos de desapropriação de novas áreas.
“Todo ano tem luta. Fazemos as jornadas de abril, agosto, outubro. O
governo faz a promessa mas nada acontece. Os técnicos do Incra falam que a
Reforma Agrária não é a prioridade da presidenta”, disse Amorim.
Nessa linha, os Sem Terra apontaram a necessidade de criar uma
interministerial para agilizar e resolver os problemas dos acampados. “O Incra
está desestruturado e sem ingerência, e está sendo conduzido de uma maneira
conservadora”, apontou Jaime, ao colocar a prioridade em construir uma meta
emergencial para resolver os problemas das áreas que estão com maiores
conflitos.
Há tempos que servidores do Incra relatam para o governo federal um
déficit na sua capacidade operacional e uma desvalorização do corpo técnico.
Desde 2006, cerca de 40% dos servidores saíram do órgão e mais de 2000 pessoas
se aposentaram, diminuindo a capacidade operacional em mais de 50%.
Perímetros Irrigados
No objetivo de solucionar parte dos problemas das famílias acampadas,
que em todo o país somam cerca de 150 mil, os Sem Terra expuseram a
problemática em torno das áreas de perímetro irrigado no nordeste brasileiro.
Destas 150 mil famílias que esperam por um pedaço de terra, em torno de
60% estão concentradas no nordeste. Em paralelo a isso, há 80 mil lotes vagos
nas áreas de perímetro irrigado, o que possibilitaria assentar todas as
famílias da região.
As políticas desenvolvidas nessas áreas, no entanto, priorizam as
parcerias com empresas privadas em detrimento de resolver os problemas sociais
da região. “As Parcerias Público Privadas são uma afronta ao desenvolvimento
regional. É preciso construir um plano de recuperação para resolver o problema
da terra no nordeste”, enfatizou Amorim.
O Departamento de Obras Contra a Seca (Dnocs), órgão responsável pelo
controle dessas áreas, é apontado pelos movimentos sociais como um reduto da
oligarquia local, impedindo que políticas de caráter mais social possam ser
desenvolvidas. “É preciso romper com esse órgão e passar a responsabilidade
para o Incra”, disse João Pedro Stedile.
“Vou olhar pessoalmente a questão dos perímetros irrigados”, garantiu a
presidenta.
Seca
Em 2012, parte da população nordestina viveu a pior seca dos últimos 50
anos, gerando diversas dificuldades sociais e econômicas na região. Quatro
milhões de animais morreram na estiagem, quando mais de 1200 municípios
decretaram emergência.
“A pior seca é aquela que a gente vive”, lembrou Débora ao
denunciar que “muitas políticas do governo, como água, crédito, carro pipa não
estão chegando aos assentados”.
“A seca não é uma maldição divina, temos que controlá-la, e não brigar
contra ela. Listemos e façamos o que é urgente”, respondeu a presidenta, ao
apontar diversas medidas emergenciais construídas nos últimos anos para
solucionar esse problema.
Por outro lado, Débora alegou uma série de burocracias para acessar os
créditos referentes a essas políticas.
PAA
Reconhecida pelas organizações como uma política importante que garante
aos assentados a venda de sua produção, o Programa de Aquisição de Alimentos
(PAA) precisa ter seu orçamento aumentado, segundo os Sem Terra.
“O volume de dinheiro hoje do PAA atinge apenas 5% das famílias
assentadas. É urgente e necessário colocar mais dinheiro na Companhia Nacional
de Abastecimento (Conab) para potencializar e massificar a produção”, cobrou
Stedile, que foi respondido com o comprometimento de Dilma em determinar que o
Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) disponha mais recursos para ampliar
a ação desses programas.
Para Débora Nunes, a luta e o congresso realizado pelos Sem Terra ao
longo dessa semana permitiu recolocar a pauta da Reforma Agrária no governo e
na sociedade. “Pudemos denunciar os problemas e mostrar a necessidade de soluções
emergenciais. Mas seguiremos nos mobilizando para pressionar que essas
promessas tenham respostas rápidas e reais”, afirmou.
Luiz Felipe Albuquerque – 14.02.2014
Da
página do MST.
IN
Brasil de Fato – http://www.brasildefato.com.br/node/27459