domingo, 26 de outubro de 2014

Racismo de classe


Campanhas de oposição a governos podem ser politicamente agressivas, exibir estatísticas verdadeiras, manipular outras informações nem tão verdadeiras, e reafirmar fanaticamente as convicções partidárias mais delirantes. Campanhas pró-governo, idem. Mas o que não se pode fazer, numa sociedade democrática, é advogar a ideia de que há duas classes de pessoas: as que votam bem e as que votam mal.

Adriano Codato e Fábia Berlatto
O racismo de classe explicitado nas eleições brasileiras deste ano ultrapassou os limites da convivência civilizada. Autorizar-se a exibir ostensivamente preconceito social, discriminação regional, superioridade étnica em relação à categoria social dos pobres, ao contrário do que se pensa, não é um direito autêntico da sociedade democrática. Por quê? Porque pressupõe e defende hierarquias “naturais”, “culturais” e, com base nelas, cria duas classes de pessoas: os politicamente competentes e os politicamente incompetentes.
O racismo de classe funciona conforme a mecânica perversa de todo o preconceito. Enquanto no racismo tradicional o sentimento de superioridade é dirigido a uma etnia (“raça”) considerada inferior, seja por razões biológicas, seja por razões históricas, o racismo de classe se dirige a um grupo por suas características socioeconômicas e constrói, sobre ele, toda sorte de fantasias. Os pobres são ignorantes porque desconhecem as informações verdadeiras que nós possuímos sobre os políticos, a economia etc. São irracionais, porque as razões que dirigem seu voto são ilegítimas para nossas prioridades. E são incompetentes, porque, afinal, são pobres.
Três exemplos ajudam a ilustrar o que estamos falando. Em setembro, a Associação Comercial e Industrial de Ponta Grossa editou um manual defendendo que os favorecidos pelo Bolsa Família tivessem seus direitos políticos suspensos. Em outubro, publicados os resultados do primeiro turno, o ódio “aos nordestinos” voltou mais agressivo e menos constrangido do que em 2010. Agora, conforme a campanha eleitoral foi se tornando mais competitiva, o delírio do anticomunismo, mais extrovertido, e as oposições, mais confiantes, um economista de televisão pontificou no Facebook que “quem estuda não vota na Dilma”. O esplendor dessa campanha foi atingido por um colunista social que sugeriu trancar em casa, no dia da eleição, as empregadas domésticas e os porteiros dos prédios para que não votassem na situação.
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Para continuar a leitura, acesse http://www.gazetadopovo.com.br/m/conteudo.phtml?tl=1&id=1508569&tit=Racismo-de-classe-






Adriano Codato – Doutor em Ciência Política pela Unicamp, é professor de Ciência Política na UFPR, editor da Revista de Sociologia e Política (UFPR) e da revista Paraná Eleitoral (TRE-PR) e coordenador do Observatório de elites políticas e sociais do Brasil.
Fábia Berlatto – Doutoranda em Sociologia, é professora do curso de Especialização em Sociologia Política na UFPR e integrante do Centro de Estudos de Segurança Pública e Direitos Humanos da mesma universidade – 14.10.2014

IN Gazeta do Povo.